PENDÊNCIAS RN-Microcefalia e aborto, por Luiz Claudio Tonchis


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Por Luiz Claudio Tonchis

A epidemia do Zika vírus, o qual é suspeito de ter relação com os casos de microcefalia, reacende o debate sobre uma questão polêmica – a legalização do aborto. A comissão responsável pelos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) recomenda que os países atingidos pelo vírus permitam legalmente o acesso voluntário de mulheres ao aborto. O Brasil, um dos mais afetados pela epidemia, a interrupção da gravidez é proibida, com exceção em casos de estupro, risco de vida para a mãe e em casos de feto anencefálico.

Os bebês portadores de anencefalia são diferentes dos que apresentam microcefalia (condição em que o cérebro não cresce o suficiente durante a gestação). No primeiro caso, não há sobrevida, o bebê morre logo após o nascimento. Segundo a medicina, 91% eles morrem até uma semana após o parto e apenas 1% sobrevive até três meses. Já uma criança portadora de microcefalia tem melhores perspectivas de sobrevivência, mas apresentará variados problemas de deficiência intelectual ou física.

De acordo como o Ministério da Saúde: “O Zika é um vírus transmitido pelo Aedes aegypti e identificado pela primeira vez no Brasil em abril de 2015. O vírus Zika recebeu a mesma denominação do local de origem de sua identificação em 1947, após detecção em macacos sentinelas para monitoramento da febre amarela, na floresta Zika, em Uganda. O principal modo de transmissão descrito do vírus é pela picada do Aedes aegypti” (o mesmo transmissor do vírus da Dengue e o da Febre Chikungunya).1

No entanto já existem evidências de transmissão através do leite materno, assim como pela urina, saliva e sêmen. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), órgão vinculado ao Ministério da Saúde, divulgou recentemente a constatação da presença do vírus Zika ativo (com potencial de provocar a infecção) em amostras de saliva e de urina de pacientes.

As evidências, no entanto, não são suficientes para afirmar que a presença do vírus na saliva ou outras possíveis formas de transmissão poderiam infectar outras pessoas. “Serão necessários outros estudos para analisar, por exemplo, qual o tempo de sobrevivência do vírus Zika e, após passar pelos sucos gástricos, se tem capacidade de infectar as pessoas. A recomendação, neste momento, é da cautela e de prevenção, com orientações conhecidas para outras doenças, como evitar compartilhar objetos de uso pessoal (escovas de dente e copos, por exemplo) e lavar as mãos. Os maiores cuidados devem ser tomados pelas as grávidas, que devem se proteger”. 2

A BBC Brasil revelou no seu portal que “uma ação que pede a descriminalização do aborto em casos comprovados desta má-formação deve chegar ao Supremo Tribunal Federal, nos próximos dois meses”.3 O problema é que a opiniões sobre a legalização do aborto são plurais e antagônicas.

Pois bem, as discussões sobre a descriminalização do aborto foram e sempre serão permeadas de polêmica. Envolvem questões morais, éticas, legais e religiosas. O aborto é, pelas suas características, sempre indesejado, ou seja, mesmo quando uma mulher opta por esta prática, independentemente da motivação, é sempre traumático e uma experiência trágica. Sua eventual descriminalização implicará em que as mulheres não poderão praticar o aborto livremente, fora dos parâmetros fixados por lei. E o principal freio para a sua prática é a consciência moral de cada uma. Nenhuma regra, ou lei imposta é capaz de coibir esse princípio.

Porém, infelizmente, vemos que no Brasil a proibição legal é inútil. As mulheres provocam o aborto, clandestino, de risco. Não importa o que os médicos, a igreja ou as demais pessoas pensem a respeito. Não há campanha que possa evitá-lo, pois mesmo as mulheres mais bem informadas e com nível socioeconômico mais elevado o fazem. Quando o aborto é proibido por lei, só há uma solução: a intervenção clandestina – e os resultados são os altos índices de mortalidade.

Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), uma brasileira morre a cada dois dias por conta de procedimentos mal feitos e calcula-se que um milhão de abortos clandestinos sejam realizados no país, por ano. Segundo o médico Drauzio Varela, no mesmo artigo, critica qualquer enfoque religioso sobre o tema – que voltou ao noticiário junto à epidemia de vírus Zika e aos recordes em notificações de microcefalia – e afirma que o centro da discussão não está na moralidade, mas na desigualdade brasileira. “Ninguém pode se considerar dono da palavra de Deus, intermediário entre deuses e seres humanos, para dizer o que todos devem fazer”, diz Varela. “Muitos religiosos pregam que o aborto não é certo. Se não está de acordo, não faça, mas não imponha sua vontade aos outros.” E completa: “A mulher rica faz normalmente e nunca acontece nada. Já viu alguma ser presa por isso? Agora, a mulher pobre, a mulher da favela, essa engrossa estatísticas. Essa morre.” 4

Assim, o peso da proibição legal do aborto, além de milhares de mortes, são as graves sequelas que a mulheres podem carregar pelo resto da vida, principalmente as mais pobres. As que podem pagar contam com clínicas sofisticadas, ainda que clandestinas. Além de passarem pela angústia de decidir pelo aborto, decisão sempre difícil, as mulheres enfrentam riscos que poderiam ser evitados com a legalização. Isso significa reconhecer que o aborto não é algo positivo, mas proibi-lo causa mais problemas.

O melhor método para evitar abortos é a prevenção, ou seja, uma educação sexual mais efetiva. Quanto ao direito ao aborto das vítimas do Zika, existe um agravante, e só é possível detectar microcefalia depois dos 6 meses de gestação, quando nem os países mais liberais permitem o aborto. Mesmo assim, um estado democrático de direito deverá reconhecer o direito de escolha da gestante. Cabe a ela a escolha sobre seu projeto de vida e de família, especialmente em um momento dramático como durante uma epidemia. É inaceitável que as pessoas que rejeitam o aborto por convicções morais e religiosas destruam o direito daquelas que tenham a necessidade de se submeter ao procedimento.

 

Luiz Claudio Tonchis é Educador e Gestor Escolar, trabalha na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, é bacharel e licenciado em Filosofia, com pós-graduação em Ética pela UNESP e em Gestão Escolar pela UNIARARAS. Atualmente é acadêmico em Pós-Graduação (MBA) pela Universidade Federal Fluminense. Escreve regularmente para blogs, jornais e revistas, contribuindo com artigos em que discute questões ligadas à Política, Educação e Filosofia.

Contato:  [email protected]

 

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Levany Júnior

Levany Júnior é Advogado e diretor do Blog do Levany Júnior. Blog aborda notícias principalmente de todo estado do Rio Grande do Norte, grande Natal, Alto do Rodrigues, Pendências, Macau, Assú, Mossoró e todo interior do RN. E-mail: [email protected]

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