PENDÊNCIAS RN-“Empurrão” para o próprio negócio


172421Nadjara Martins e Renata Moura
Repórter e Editora de Economia

Era final de expediente da segunda-feira, 23 de novembro, quando o decorador Paulinho Tajovky, 47 anos, foi chamado à diretoria. O anúncio da demissão veio sem rodeios: a empresa enfrentava a malfadada crise econômica de 2015 e mudanças na gerência, e precisava cortar custos. “Fiquei paralisado. Jamais poderia imaginar que seria despedido. Passei uma semana em casa, chorando, achando ‘não tem saída, não tem saída’, até que pensei: quer saber de uma coisa? Eu vou reagir”,  lembra. Paulo decidiu se virar por conta própria. “Resolvi trabalhar com as minhas próprias mãos.”

Alex RegisPaulinho Tajovky, 47: Após demissão, ganhos maiores com o próprio negócio como decoradorPaulinho Tajovky, 47: Após demissão, ganhos maiores com o próprio negócio como decorador

A sala do apartamento, que fica em frente ao antigo emprego, na Cidade Alta, em Natal, se transformou em estoque de mercadorias; o quarto – decorado com biombos e esculturas que ele mesmo fez – virou escritório e ateliê. “Foram os próprios clientes da loja que me deram força, reconheceram o meu trabalho. Ligavam para mim, falavam que acreditavam no meu potencial. Diziam: trabalha só para você”, conta Paulinho. Até agora deu certo: nos últimos 30 dias, o decorador ganhou três vezes o salário que recebia na loja de decoração. Ainda sem empresa “registrada”, vai esperar o fim das festas de final de ano para decidir sobre a formalização. Para o empreendimento dar certo, segundo ele, o caminho é só um. “A primeira coisa para deixar de lado é o comodismo.”

O número de trabalhadores autônomos disparou no Rio Grande do Norte e atingiu, no terceiro trimestre, o maior crescimento do Brasil: 10,34%, se comparado ao mesmo período do ano passado.

De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 33 mil pessoas se somaram às 319 mil que em igual trimestre do ano passado já sobreviviam no estado como comerciantes, costureiros, carpinteiros, reparadores de equipamentos elétricos e manicures – entre outras atividades em que não existem patrões nem empregados. Em todo o Brasil, 23 milhões de pessoas integram o batalhão dos conta própria.

Empreender
O desejo de empreender já vinha crescendo entre os brasileiros nos últimos anos: de acordo com a edição 2014 da pesquisa Global Entrepreneurship Monitor  (GEM), elaborada pelo Sebrae e o Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade  (IBQP), o empreendedorismo atrai três a cada 10 brasileiros.

Segundo a pesquisa, 34% dos brasileiros entre 18 e 64 anos possuem ou estão desenvolvendo o próprio negócio. Pela primeira vez na década, o percentual de pessoas que desejam ter um empreendimento (31%) é quase duas vezes o percentual daquelas que almejam crescer dentro de uma empresa (16%).

Há quem esteja atento a oportunidades. Mas a necessidade tem falado alto nos últimos meses. E o aumento das demissões no mercado é apontado como grande combustível, agora, para um número cada vez maior de trabalhadores se dedicarem ao próprio negócio, formalizando-os ou não.

Para se ter uma ideia, a taxa de desocupação da população acima de 14 anos no Rio Grande do Norte alcançou 12,6% no último trimestre, perdendo apenas para a Bahia, cujo percentual chegou a 17%. Em compensação, entre janeiro e outubro deste ano, o RN também registrou um aumento de 14% no número de empresas abertas. Foi o maior índice entre as unidades da federação. De acordo com o Índice Serasa Experian de Nascimento de Empresas, foram 2.175 empreendimentos registrados somente no mês de outubro.

Série de reportagens da TRIBUNA DO NORTE mostra, a partir de hoje, as causas e os efeitos deste cenário, mas também indica “pontos de luz” para quem se enquadra no grupo e quer crescer, se destacando no meio da multidão.

Da necessidade ao desejo de abrir um ‘disque-manicure’
A mala roxa de rodinhas é a fiel companheira de Micarla Oliveira, 36 anos. Dentro dela estão alicates, palitos, tesouras e esmaltes que percorrem toda a cidade. Demitida duas vezes nos últimos sete anos, Micarla, que só tinha um “curso básico”, empreendeu por necessidade: tornou-se manicure. Em vez de atender em um salão, ela vai até a casa das clientes. Caso não consiga retornar ao mercado de trabalho nos próximos seis meses, pensa em expandir o negócio, criando um “disque-manicure”, semelhantes aos que já existem para outros serviços, como táxi.

Há seis anos, ela começou a atuar como manicure. Hoje, é microempreendedora individual.  “Alguns representantes vendem os produtos mais baratos para quem tem CNPJ”, cita Micarla, entre as vantagens.

Com o arrocho das contas em casa, ela voltou ao mercado como secretária no início deste ano. Mas a recessão fez a empresa fechar postos e a levou, mais uma vez, a “fazer unhas”. Com o dinheiro da rescisão, colocou em dia todas as contas e decidiu: dinheiro para investir em produtos só o que fosse gerado pelo próprio negócio.

A manicure atende, em média, cinco clientes por dia e quer mais. “É uma área que dá certo. Nesta época, todo mundo liga e uma semana antes a agenda já está cheia. Se eu tivesse mais gente trabalhando para mim, daria conta de todas as clientes”.

‘Recreação’: De hobby à oportunidade de mercado
O sonho da curitibana Iponá Taffarel, 37 anos, sempre foi transformar o hobby em um negócio de verdade. O jeito para lidar com crianças, gestado durante 30 anos de escotismo, acabou rendendo à microempresária a criação de uma empresa de recreação, há dois anos. A decisão de investimento só veio após a demissão de Iponá de uma multinacional, em 2007.

Porém, até 2013, quando se cadastrou como Microempreendedora Individual (MEI), ela sempre tentava conciliar o próprio negócio com postos no mercado de trabalho formal. Trabalhou como animadora em cruzeiros pela Europa e Brasil, quando ainda vivia na capital do Paraná; mudou-se para São Paulo, mas o mercado mais competitivo e a necessidade de se manter na cidade a levaram a voltar para o trabalho “fichado” em uma empresa de eventos.

Foi quando a empresária decidiu se demitir e mudar para Natal junto com o marido que o negócio começou a dar frutos. Embora já trabalhasse com a empresa há seis anos, Iponá conta que a formalização lhe rendeu mais credibilidade.

E, por enquanto, ela não estuda voltar ao mercado de trabalho. “Tive que sair para que novas oportunidades pudessem acontecer. Talvez lá eu estivesse frustrada, pois não podia realizar o que eu realmente gostava”, conta. “Dificuldade existe sim, mas a gente não pode desistir.”

Rate this post



Levany Júnior

Levany Júnior é Advogado e diretor do Blog do Levany Júnior. Blog aborda notícias principalmente de todo estado do Rio Grande do Norte, grande Natal, Alto do Rodrigues, Pendências, Macau, Assú, Mossoró e todo interior do RN. E-mail: [email protected]

Comentários com Facebook




Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.