FOTOS IMAGENS-Grupo afiliado ao Estado Islâmico usa mulheres sequestradas para atentados
No último dia 9, duas meninas recém chegadas ao campo de refugiados em Dikwa, no nordeste da Nigéria, detonaram explosivos conectados ao próprio corpo, matando 58 pessoas e ferindo outras 78. Uma terceira menina, também munida de bombas, desistiu de cometer o ataque para o qual fora enviada junto às colegas ao reconhecer, entre os refugiados do campo, seus pais e irmãos – antes de se detonar, acabou se entregando para as autoridades locais
O episódio é o mais recente na lista de barbaridades cometidas pelo grupo islamista radical Boko Haram, que aterroriza a Nigéria e seus vizinhos desde 2009, quando abraçou a violência e o terrorismo com o objetivo de instaurar um califado islâmico no país – em março do ano passado, o grupo ainda jurou lealdade ao Estado Islâmico.
Só nos primeiros 50 dias de 2016, o Boko Haram já matou mais de 150 pessoas. Uma semana antes dos ataques suicidas em Dikwa, seus militantes invadiram o vilarejo de Dalori, também no nordeste da Nigéria, ateando fogo em casas, atirando em seus moradores e detonando bombas entre aqueles que fugiam – pelo menos 86 pessoas morreram, entre eles crianças e famílias inteiras que morreram queimadas vivas dentro de suas casas. Dias antes, um ataque suicida matou 25 pessoas na cidade de Chibok – a mesma onde o grupo levou a cabo seu sequestro de quase 300 meninas em uma escola, em abril de 2014 – que foi seguido de outro homem-bomba na cidade de Gombi, onde 10 pessoas morreram. O campo de Dikwa, alvo dos ataques mais recentes, abriga hoje cerca de 52 mil pessoas, a maioria crianças e mulheres que fugiram das atrocidades cometidas pelo grupo.
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A violência que aterroriza os moderadores da região nordeste da Nigéria, local de fundação e operação do Boko Haram, acontece pouco depois de o presidente do país, Muhammadu Buhari, dizer que o grupo estava praticamente derrotado. “Tecnicamente, nós ganhamos a guerra”, afirmara em dezembro Buhari, em referência à ofensiva contra o grupo capitaneada por ele desde que assumiu o cargo, em maio de 2015. Nesse período, o exército nigeriano prendeu e matou dezenas de militantes e reconquistou boa parte do território antes detido pelo Boko Haram. Porém, com os múltiplos ataques vistos nos últimos meses – que tiveram como alvo países inclusive, como Camarões e Chade – a declaração de Buhari parece cada vez mais prematura.
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As autoridades nigerianas atribuem a onda de ataques suicidas ao que seria “desespero” por parte do Boko Haram, diante das perdas sofridas em 2015. Quem paga o preço, no entanto, é a população civil: além das centenas de mortos e feridos, a Organização das Nações Unidas (ONU) calcula que 2,4 milhões de pessoas já fugiram da região nordeste da Nigéria por causa da violência.
Os últimos ataques também chamam atenção pela estratégia: o uso de meninas e crianças em missões suicidas. A tática não é nova, mas parece ser utilizada cada vez com maior frequência: as Nações Unidas estimam que, desde junho de 2014, o Boko Haram tenha enviado cerca de 100 meninas e mulheres, antes mantidas em cativeiro, para cometer os ataques suicidas antes levados a cabo por homens. Em entrevista a uma rádio do Canadá, Mausi Segun, pesquisadora da Human Rights Watch (HRW) na Nigéria disse que a motivação para essas meninas se submeterem às ordens do grupo é complexa de esclarecer. “Honestamente, é difícil dizer. Se você se basear nos depoimentos das garotas que falharam em detonar suas bombas ou são presas pouco antes de cometerem o ataque, parece que, primeiramente, elas podem ser filhas de membros do Boko Haram. E tem aquelas que foram sequestradas e que o fazem por medo, medo de desobedecer alguém em posição de autoridade”, afirmou Segun. Analistas afirmam que muitas podem ter passado por um processo de radicalização enquanto eram mantidas em cativeiro, ou não tinham consciência que os dispositivos que carregavam poderiam matá-las.
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Tais ataques contribuem ainda com o estigma já carregado por mulheres vítimas do grupo. Estima-se que o Boko Haram tenha sequestrado pelo menos 2 mil mulheres e meninas desde 2012. Dentre elas estão as 276 estudantes escolares ainda desaparecidas sequestradas na cidade Chibok, em abril de 2014, e que motivaram a campanha mundial “Bring Back Our Girls” (Tragam nossas garotas de volta). Conforme o exército nigeriano reconquistou territórios previamente detidos pelo grupo, centenas de sobreviventes acabaram libertadas e narraram sua rotina de abusos, violência e estupros – muitas se encontram grávidas de seus abusadores. Uma novo relatório da organização International Alert em parceria com a Unicef , publicado na semana passada, alerta para o estado de desamparo dessas vítimas, sem acesso a serviços básicos que as auxiliem na superação do trauma, além de sofrerem ainda com a discriminação e a desconfiança de suas comunidades ao retornarem do cativeiro. “Existe o temos que se as necessidades dessas sobreviventes e populações que retornaram não forem atendidas, esses fatores podem adicionar ainda outra dimensão a uma situação já complexa de conflito no nordeste da Nigéria”, afirma no relatório Kimairis Toogood, da International Alert.
Um país aterrorizado
Menos falado que outros países afligidos pelo terrorismo, a Nigéria foi listada no relatório do Global Terrorism Index de 2015, produzido pelo Instituto de Economia e Paz, como o terceiro país no mundo mais afetado pelo terrorismo – atrás apenas do Iraque e do Afeganistão – e o país do continente africano cujo o impacto do terrorismo era maior.
Além disso, o Boko Haram foi apontado pelo relatório como o grupo de terrorista mais mortal do mundo, superando inclusive os Estado Islâmico, com base no número de mortes cometida em 2014, que ultrapassava os 6 mil. Desde 2009, o grupo já matou mais de 17 mil pessoas.
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