BRASIL -De Fordlândia a ‘bem comum’: as contradições na história do interesse estrangeiro na Amazônia


 

em comum’: as contradições na história do interesse estrangeiro na Amazônia

Popular entre militares, discurso de que ONGs e ambientalistas estariam a serviço de potências estrangeiras evoca disputas comerciais e conflitos históricos, mas não leva em conta papel que brasileiros – entre os quais indígenas e geólogos – tiveram na criação de grandes reservas na floresta

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Criticado pelos incêndios na Amazônia, o governo Jair Bolsonaro diz ser vítima de uma campanha no exterior, na qual o discurso ambientalista serviria de pretexto para interesses econômicos de outros países na região e buscaria enfraquecer o agronegócio brasileiro diante de competidores.

Um dos objetivos dessa campanha, segundo o governo, seria questionar a soberania do Brasil sobre a Amazônia, abrindo o caminho para a sua internacionalização ou para a criação de Estados autônomos em terras indígenas.

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A tese, que ecoa antigas preocupações das Forças Armadas, teve bastante projeção na ditadura militar (1964-85). Ela se ampara, em parte, em momentos históricos em que estrangeiros cobiçaram as riquezas da Amazônia e nos discursos de agricultores europeus e americanos que defendem a preservação da floresta por temerem a expansão da produção brasileira.

Mas o argumento não leva em conta as várias ocasiões em que estrangeiros investiram na Amazônia com a concordância do Brasil – como o próprio governo Bolsonaro tem estimulado – e o crescente movimento que vê a proteção de florestas tropicais como crucial para mitigar o aquecimento global.

A posição também tende a ignorar o papel que brasileiros – entre os quais indígenas e geólogos – tiveram no arranjo legal que resultou na demarcação de grandes terras indígenas na Amazônia, várias delas em áreas ricas em minérios.

Cooptação de indígenas

Na tese de doutorado “Amazônia: pensamento e presença militar”, a cientista política Adriana Aparecido Marques, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), conta que os temores das Forças Armadas quanto à cooptação de indígenas por estrangeiros remontam à época em que a Amazônia teve suas fronteiras demarcadas, no Brasil Colônia.

Marques diz que “os fardados temem que os indígenas contemporâneos ajam como alguns de seus antepassados, que, no passado, aliaram-se a ingleses, holandeses e franceses que pretendiam conquistar terras na região”.

Há ainda o receio de que indígenas busquem alianças com grupos não estatais que queiram mudar a ordem política local, como a que uniu indígenas Mura a revoltosos na Cabanagem (1835-1840), no Pará.

Discurso sobre manipulação de indígenas por ONGs os trata como 'inocentes frágeis', diz antropóloga

Discurso sobre manipulação de indígenas por ONGs os trata como ‘inocentes frágeis’, diz antropóloga

Agência Brasil/ BBC NEWS BRASIL

“A percepção de que a soberania brasileira sobre a região está ameaçada”, escreve Marques, “não é recente e nem pode ser reduzida a uma mera resposta dos militares brasileiros aos constrangimentos impostos pelo sistema internacional”.

Líderes estrangeiros

“A ameaça à soberania brasileira na Amazônia de fato existe e, de vez em quando, ela floresce”, diz à BBC News Brasil o general de reserva Humberto Madeira, hoje chefe de gabinete do deputado federal Coronel Armando (PSL-RJ).

O general, que passou a maior parte de sua carreira militar na região, diz que os temores se justificam pelos conflitos e revoltas do passado e por declarações de líderes estrangeiros que veem a floresta como um bem global. “Isso nos deixa bastante preocupados”, afirma.

Quando foi presidente da França, entre 1981 e 1995, François Miterrand defendeu a visão de que a Amazônia era um “patrimônio da humanidade”. A tese foi reciclada pelo atual presidente francês, Emmanuel Macron, que se referiu à Amazônia como “nosso bem comum” ao criticar os incêndios na floresta nas últimas semanas.

Macron lembrou que a França também é um país amazônico por meio da Guiana Francesa – território francês que faz fronteira com o Brasil. No domingo, ao retomar o tema na reunião do G7, o presidente francês disse respeitar a soberania dos demais países amazônicos.

Segundo Anthony Pereira, diretor do Brazil Institute da Universidade King’s College, em Londres, a tese de que a Amazônia “pertence ao mundo” não é nova.

“No livro a Diplomacia na Construção do Brasil 1750-2016, o ex-embaixador Rubens Ricupero escreve sobre o conflito entre Brasil, de um lado, e Estados Unidos, França e Reino Unido, do outro, sobre o acesso ao rio Amazonas nas décadas de 1850 e 1860. Essas três potências argumentavam que, sob o espírito do livre comércio e do liberalismo, suas embarcações deveriam ter o direito de navegar pelo rio. O governo brasileiro finalmente abriu o rio à navegação internacional em 1866”, disse.

Colonização da Amazônia

Adriana Aparecido Marques, da UFRJ, afirma em sua tese que os militares brasileiros se veem como sucessores dos colonizadores portugueses em relação à Amazônia e compartilham da crença de que a região precisa ser ocupada por não indígenas para que o país não a perca.

Porém, a destruição causada por essa ocupação – que historicamente inclui a abertura de estradas, a construção de hidrelétricas e a expansão da agropecuária e da mineração – acaba alimentando no exterior a polêmica tese de que a Amazônia deve ser tratada como um “bem comum” da humanidade, e não apenas um território do Brasil.

Christopher Sabatini, especialista em América Latina no centro de pesquisas Chatham House, em Londres, disse à BBC que países ricos tratam a Amazônia com “arrogância”.

“Os países que, em seu processo de desenvolvimento, contribuíram com as emissões de gás carbônico agora querem proteger a Amazônia. Eles poluíram nos últimos dois séculos. É uma visão colonialista”, afirmou à BBC News Brasil.

Trecho da rodovia Transamazônica no Amazonas; obra foi planejada pela ditadura militar para integrar Amazônia ao resto do país

Trecho da rodovia Transamazônica no Amazonas; obra foi planejada pela ditadura militar para integrar Amazônia ao resto do país

IBGE/ BBC NEWS BRASIL

Política indigenista

A visão de que a estratégia de colonização da Amazônia segue válida ainda tem defensores nas Forças Armadas.

Em 2008, o então comandante militar da Amazônia e hoje ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Augusto Heleno, disse que a política indigenista brasileira deveria ser revista por estar “completamente dissociada do histórico de colonização do nosso país”.

Heleno se referia à demarcação de terras indígenas, que impediria a ocupação de partes do território nacional por não índios. “Como um brasileiro não pode entrar numa terra porque é terra indígena?”, questionou o general.

É preciso de autorização da Funai para entrar em uma das 567 terras indígenas, embora nem sempre a norma seja respeitada. Entre as principais justificativas estão impedir o contágio por doenças que poderiam dizimar as comunidades e evitar invasões por grileiros. A restrição não vale para as Forças Armadas, que podem entrar em qualquer terra indígena. Muitos pelotões do Exército ficam inclusive dentro dessas áreas.

Apesar da persistência dessas visões, Marques afirma que a desconfiança das Forças Armadas em relação às comunidades nativas vem diminuindo nas últimas décadas à medida que o Exército passou a recrutar mais indígenas como soldados. Hoje vários pelotões do Exército em regiões de fronteira são compostos, em sua maioria, por indígenas.

“A necessidade de aprender com os nativos para combater um possível invasor estrangeiro faz com que o Exército procure incorporar, cada vez mais, indígenas em seu efetivo (…). O fato é que o desempenho dos soldados de origem indígena nos exercícios de sobrevivência na selva fez com que os militares revissem algumas de suas visões acerca da cultura nativa”, escreve a professora.

 Transporte de borracha pelo rio Acre; presença do material na Amazônia despertou grande interesse estrangeiro pela região no século passado Interesse pela borracha

Transporte de borracha pelo rio Acre; presença do material na Amazônia despertou grande interesse estrangeiro pela região no século passado Interesse pela borracha

BBC NEWS BRASIL

Os temores quanto à soberania brasileira sobre a Amazônia cresceram no século 20, ao longo do qual várias comissões parlamentares foram criadas para investigar o tema, segundo um artigo do cientista social João Roberto Martins, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar-SP).

Na primeira metade do século, governos e investidores estrangeiros passaram a mirar o potencial da região para a produção de borracha, cuja principal matéria-prima advinha de uma árvore local, a seringueira.

Atento ao interesse, o governo Getúlio Vargas negociou com os EUA em 1940 um acordo para fornecer látex para as Forças Armadas americanas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45) e interromper as exportações para os países do Eixo (Alemanha, Japão e Itália).

Anos antes, em 1927, o empresário americano Henry Ford havia fechado um acordo com o então governador do Pará para a construção de um complexo agroindustrial que suprisse a demanda da montadora por pneus. O empreendimento, batizado de Fordlândia, quebrou e foi abandonado em 1945.

Outra tentativa estrangeira com aval governamental de instalar um complexo industrial na Amazônia foi o projeto Jari, que ocupava uma área equivalente à de Sergipe em partes do Pará e do Amapá. Liderado pelo empresário americano Daniel Keith Ludwig, o empreendimento envolvia atividades industriais, agrícolas e a extração de minérios e madeira.

O projeto começou em 1967 com o apoio da ditadura militar, mas os fracos resultados fizeram Ludwig abandoná-lo em 1982.

A Amazônia foi cobiçada também pelo magnata Nelson Rockefeller, que posteriormente se tornaria vice-presidente dos EUA e via na floresta uma “reserva gigante de matérias-primas” para suas indústrias.

Mas ele abriu mão dos planos de investir na região após ser desencorajado pela Casa Branca, para quem o empreendimento poderia incomodar o governo Vargas e prejudicar a relação entre os dois países.

O caso, narrado no livro “Thy Will Be Done: The Conquest of the Amazon” (Seja feita a Vossa vontade: a conquista da Amazônia, de Gerard Colby e Charlotte Dennett), indica que o governo dos EUA sabe há muito tempo que a Amazônia é um tema sensível para brasileiros.

Em 2009, o então embaixador americano no Brasil, Clifford Sobel, disse em um telegrama diplomático revelado pelo Wikileaks que militares brasileiros têm o que ele chamou de “paranoia” em relação a ONGs que atuam na região, vendo-as “como ameaças potenciais à soberania” do país.

 Seringueiros voltam do trabalho em Belterra, no Pará, em 1953 Bush e Thatcher

Seringueiros voltam do trabalho em Belterra, no Pará, em 1953 Bush e Thatcher

BBC NEWS BRASIL

Episódios posteriores à Segunda Guerra ampliaram o receio dos militares sobre interferências estrangeiras na Amazônia, conforme atestam várias monografias publicadas pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército.

Uma delas, escrita em 2000 pelo coronel reformado Alei Salim Magluf, lista ocasiões em que líderes de outros países teriam agido para proteger seus interesses na região.

Magluf cita a pressão que o então presidente dos EUA, George W. Bush, fez para impedir que o Japão financiasse a pavimentação da rodovia BR-364. A obra abriria uma nova rota para a exportação de grãos, o que aumentaria a competitividade da produção brasileira frente a agricultores americanos.

Ele também menciona no trabalho o apoio da então premiê britânica Margaret Thatcher à vinculação da dívida externa de países emergentes – entre os quais o Brasil – à venda de recursos naturais, o que reduziria o poder do Brasil em decidir o que fazer com as riquezas amazônicas.

Mais recentemente, entraram na lista de temores sobre a ingerência indevida na Amazônia atos e discursos de agricultores que competem com produtores brasileiros.

Em 2017, começou a circular no Brasil um relatório produzido por uma consultoria a pedido da National Farmers Union, um dos principais sindicatos de agricultores dos EUA.

 Mario Juruna, indígena da etnia xavante que foi deputado federal

Mario Juruna, indígena da etnia xavante que foi deputado federal

Câmara dos Deputados/ BBC NEWS BRASIL

Intitulado “Farms here, forest there” (fazendas aqui, florestas lá), o documento diz que a destruição de matas tropicais provocou uma “expansão dramática na produção de commodities que competem diretamente com produtos americanos”.

O relatório defende que os EUA promovam a conservação de florestas tropicais por meio de políticas climáticas, o que favoreceria agricultores e madeireiros americanos. Segundo a publicação, o fim do desmatamento nessas áreas faria com que agricultores americanos ganhassem entre US$ 190 bilhões e US$ 270 bilhões adicionais de 2012 a 2030.

Para o engenheiro agrônomo Luis Fernando Guedes Pinto, gerente de certificação agrícola do Imaflora, não existe nenhuma aliança entre ambientalistas pró-Amazônia e agricultores americanos – ainda que a agenda ambiental possa ser usada por competidores do agronegócio nacional.

“O Brasil tem uma importância enorme no comércio global de commodities e nossos competidores podem, sim, usar questões ambientais para tentar diminuir nossa competitividade. Mas isso não tem nada a ver com a motivação de ambientalistas, que baseiam sua atuação em argumentos científicos sobre a importância de preservar a floresta”, afirma.

A causa amazônica transcende questões comerciais e mobiliza muitos outros países que não disputam com a agricultura nacional, caso, por exemplo, da Alemanha e da Noruega, os principais doadores do Fundo Amazônia.

Além de abrigar a maior biodiversidade do mundo, a floresta é vista com um imenso depósito de carbono num momento em que o mundo tenta reduzir suas emissões de CO². Preservar a Amazônia significa impedir que se injete ainda mais carbono na atmosfera, pois a derrubada de matas tropicais é uma das principais fontes dessas emissões.

Barreiras não tarifárias

Nas últimas semanas, após a União Europeia e o Mercosul concluírem negociações para um acordo comercial, agricultores europeus endossaram as críticas ao agronegócio brasileiro, associando-o a práticas sanitárias, trabalhistas e ambientais pouco rigorosas.

Agricultores e pecuaristas brasileiros refutam as críticas e dizem seguir padrões tão ou mais rigorosos que os europeus.

Para o general Eduardo Villas Bôas, que comandou o Exército entre 2015 e 2019 e hoje é assessor do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, as objeções à agricultura brasileira buscam legitimar a adoção de barreiras não tarifárias contra produtos nacionais.

“Quando a inteligência brasileira, englobando a imprensa, universidade e partidos políticos, entenderá que essas são as ferramentas empregadas pelo imperialismo moderno?”, questionou o general no Twitter, no último dia 11.

As críticas ao acordo comercial uniram agricultores e ambientalistas europeus. A aliança reforçou a tese – difundida por parte do governo brasileiro – de que ONGs estrangeiras que pregam a preservação da Amazônia e a demarcação de terras indígenas estariam, no fundo, defendendo interesses econômicos de seus países de origem.

 Raoni, líder kayapó que teve grande importância na transformação da causa indígena brasileira em tema internacional

Raoni, líder kayapó que teve grande importância na transformação da causa indígena brasileira em tema internacional

Câmara dos Deputados/ BBC NEWS BRASIL

Para o general de reserva Humberto Madeira, ambientalistas que defendem a preservação da Amazônia podem até “estar legitimamente preocupados com a floresta”. “O sujeito que está lá na ponta pode ser tão idealista quanto nós (militares), mas acaba sendo manipulado pelos dirigentes das ONGs, que decidem suas estratégias alinhadas com os interesses econômicos de seus países e financiadores.”

O general não quis citar nomes de ONGs que atuariam dessa forma nem apresentou provas.

Para o Greenpeace, uma das principais ONGs ambientalistas estrangeiras em ação no Brasil, os argumentos são falsos.

“Desde que Bolsonaro tomou posse, ele vem tomando atitudes que estão promovendo um desmonte da política ambiental do Brasil”, diz Luiza Lima, da campanha de Políticas Públicas do Greenpeace.

“Quando ele busca encontrar outros culpados para as críticas que vem recebendo, ele está tentando esconder a verdade, que são seus interesses em relação à destruição da floresta.”

Lima diz que as políticas de Bolsonaro para a Amazônia têm sido criticadas não só por ambientalistas e governos estrangeiros, mas até mesmo por partes do agronegócio brasileiro, que temem as consequências do desmatamento para seus negócios e a imagem do país.

‘Instrumentos de estrangeiros’

Em sua tese de doutorado, a cientista política Adriana Aparecido Marques diz que as Forças Armadas acreditam que as ONGs estariam contribuindo com a desnacionalização da Amazônia, pois suas denúncias poderiam ser utilizadas como pretexto para intervenções militares na região.

Para ela, os militares veem os indígenas como “instrumentos de estrangeiros mal intencionados” e não reconhecem a participação que eles tiveram na demarcação de suas terras.

A hipótese de intervenções militares na região foi, inclusive, tema do artigo “Quem vai invadir o Brasil para salvar a Amazônia?”, do professor de Relações Internacionais da Universidade de Harvard Stephen M. Walt, no site da revista Foreign Policy, no início de agosto.

“Os países têm o direito – ou até a obrigação – de intervir numa nação estrangeira para evitar que ela cause dano irreversível e potencialmente catastrófico ao meio ambiente?”, questionou Walt no texto, que causou grande polêmica.

Ele cita um cenário hipotético no qual, em 2025, os EUA ameaçariam atacar o Brasil por ampliar a exploração da Amazônia e pôr em risco “um recurso global” crucial. Walt diz ter levantado essa hipótese baseado na postura de Bolsonaro quanto à Amazônia.

Indígenas como ‘inocentes frágeis’

Artionka Capiberibe, professora de Antropologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), diz à BBC News Brasil que o discurso sobre a manipulação de indígenas por ONGs erroneamente os apresenta como “inocentes frágeis”, ignorando seu papel no processo histórico que abriu o caminho para a demarcação de grandes reservas.

Capiberibe diz que, durante a Assembleia Constituinte, líderes como Ailton Krenak, Mário Juruna, Paulinho Paiakã e Raoni Metuktire tornaram a causa indígena um assunto nacional, angariando apoios para que a Constituição de 1988 reconhecesse uma série de direitos que até então eram negados aos grupos.

Antes da aprovação da Carta, o Estado brasileiro tinha a perspectiva de que os indígenas se misturariam com outros brasileiros e acabariam assimilados pela sociedade, logo, não seria necessário lhes demarcar grandes áreas.

 Militares no governo dizem haver "estranha coincidência" entre terras indígenas demarcadas e reservas minerais

Militares no governo dizem haver “estranha coincidência” entre terras indígenas demarcadas e reservas minerais

Exército Brasileiro/ BBC NEWS BRASIL

Mas a Constituição impôs um novo entendimento. Ao reconhecer o direito dos indígenas à reprodução física e cultural, a Carta abriu o caminho para a demarcação de terras extensas na Amazônia, onde as comunidades pudessem manter tradições como a caça, a pesca e a abertura de roças, além de mudar suas aldeias de lugar periodicamente.

Adriana Marques, da UFRJ, escreve em sua tese que os militares não são totalmente contrários à demarcação de terras indígenas, mas questionam a chamada “demarcação em área contínua”.

“Os principais argumentos argumentos dos fardados para se contrapor a este tipo de demarcação são a extensão das terras reivindicadas, sua localização, já que algumas das reservas demarcadas estão próximas à faixa de fronteira, e a possibilidade dessas terras de tornarem o embrião de um estado autônomo.”

Há ainda críticas à demarcação de terras indígenas em áreas ricas em minérios. Em 2017, o general Villas Bôas afirmou no Senado que o Exército tem levantamentos sobre o que ele chamou de “estranha coincidência” entre terras indígenas e reservas minerais.

Para ele, outros países seriam os principais interessados nessas demarcações. “Eles trabalham no sentido de neutralizar áreas, amortecer, já que não têm a capacidade de explorar imediatamente. E ficam esperando certamente momentos oportunos para buscar essas oportunidades”, disse o general.

Mineradoras canadenses

Villas Bôas afirmou que grande parte da pressão internacional pela preservação da Amazônia vem do Canadá, país que é sede de grandes mineradoras e que abriga uma Bolsa de Futuros para o setor.

Mineradoras canadenses têm tentado expandir a atuação na Amazônia e, em alguns casos, vêm enfrentando dificuldades justamente por causa da demarcação de terras indígenas na região.

É o caso da mineradora Belo Sun, que tenta instalar a maior mina de ouro a céu aberto do Brasil na região da Volta Grande do Xingu, no Pará. Em 2017, a Justiça suspendeu o licenciamento da mina em meio à pressão de ONGs ambientalistas, indígenas e ribeirinhos contrários ao empreendimento.

Se uma ala do governo vê com reserva os interesses do Canadá em relação à Amazônia, outra ala quer que as mineradoras canadenses e de outros países explorem minérios no Brasil – inclusive dentro de terras indígenas.

 Região do rio Negro, no Amazonas, é uma das áreas do país onde reservas minerais coincidem com terras indígenas, segundo o governo

Região do rio Negro, no Amazonas, é uma das áreas do país onde reservas minerais coincidem com terras indígenas, segundo o governo

BBC NEWS BRASIL

Em março, o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, viajou para o Canadá para um congresso de mineradoras. No evento, ele disse a executivos canadenses, em um episódio que gerou forte reação no Brasil, que o governo pretende legalizar a exploração mineral em terras indígenas. A medida – rejeitada pelas principais associações indígenas brasileiras – depende da aprovação de um projeto de lei pelo Congresso.

O presidente Jair Bolsonaro também quer parcerias com estrangeiros para explorar minérios em áreas indígenas. Ao se referir à indicação de seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), ao cargo de embaixador em Washington, ele citou as riquezas da Terra Indígena Yanomami, em Roraima.

“Se junta com a (Terra Indígena) Raposa-Serra do Sol, é um absurdo o que temos de minerais ali. Estou procurando o ‘Primeiro Mundo’ para explorar essas áreas em parceria e agregando valor”, disse.

Para Artionka Capiberibe, da Unicamp, a postura do governo é contraditória. “Por um lado, eles dizem que as demarcações de terras indígenas atendem aos interesses de estrangeiros. Por outro, propõem abrir essas terras para a exploração por estrangeiros”, ela diz à BBC News Brasil.

‘Estranha coincidência’

Um depoimento da professora de Antropologia da USP Manuela Carneiro da Cunha ao livro “Os índios e a Constituição”, lançado em agosto, sugere que, ao contrário do que afirma o general Villas Bôas, a presença de reservas minerais em terras indígenas demarcadas não é uma “estranha coincidência”.

Em 1987, Carneiro acompanhou na Constituinte a negociação do capítulo sobre direitos indígenas. Ela afirma que mineradoras faziam um forte lobby para impedir que terras pudessem ser demarcadas em cima de reservas minerais.

Mas a antropóloga diz que a Coordenação Nacional de Geólogos se opunha à entrada das empresas nessas áreas, temendo que as riquezas fossem rapidamente esgotadas sem que a população se beneficiasse.

Segundo Carneiro, os geólogos, imbuídos de um sentimento nacionalista, se aliaram aos indígenas para que as terras demarcadas pudessem coincidir com as reservas minerais. Assim, ambas seriam preservadas.

Ela diz que a aliança facilitou a aprovação do capítulo constitucional sobre os direitos indígenas. Após 1988, foram feitas grandes demarcações – várias em territórios ricos em minérios.

Hoje terras indígenas ocupam 13% do território nacional, muito menos do que antes da chegada dos portugueses, mas mais do que muitos imaginavam ser possível num passado não tão distante.

00:17/00:40R7 – Notícias

    Bolsonaro pede que Macron retire ofensa para aceitar dinheiro do G7

    Bolsonaro afirma que não ofendeu mulher de Macron
    Bolsonaro afirma que não ofendeu mulher de MacronClauber Cleber Caetano/PR – 28.06.2019

    O presidente Jair Bolsonaro disse, na manhã desta terça-feira (27) que pode aceitar os recursos oferecidos pelo G7 para a Amazônia se o presidente da França, Emmanuel Macron, retirar os insultos contra ele.

    “Para conversar ou aceitar qualquer coisa da França, que seja das melhores intenções possíveis, ele vai ter que retirar essas palavras”, diz Bolsonaro. O presidente diz que Macron o chamou de mentiroso e questionou a soberania do Brasil sobre a Amazônia.

    Segundo Bolsonaro, “primeiro ele retira [a ofensa], depois oferece ajuda], ai eu respondo”.

    O Palácio do Planalto informou na noite desta segunda-feira (26) que rejeitará ajuda de US$ 20 milhões, equivalente a R$ 83 milhões, prometidos pelo G7, o grupo de países mais ricos do mundo, para auxiliar no combate a queimadas na Amazônia.

    Já o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o Brasil vai aceitar a ajuda do grupo, apesar de acusar Macron de utilizar a Amazônia como “bandeira política”. Salles também diz que espera que país possa usar o dinheiro com autonomia.

    O presidente também negou ter ofendido a primeira-dama francesa, Brigitte Macron. No final de semana, o presidente brasileiro endossou nas redes sociais uma postagem zombando da aparência de Brigitte.

    Bolsonaro comentou um montagem de fotos comparando a aparência e a idade de sua esposa, Michelle, com a de Macron. No texto da postagem original se lê “entende agora por que Macron persegue Bolsonaro?”. O presidente comentou: “Não humilha kkkkk.”

    “É triste para ele e para os brasileiros”, disse Emmanuel Macron. “As mulheres brasileiras provavelmente têm vergonha de seu presidente. São ataques extraordinariamente desrespeitosos.”

    Governo busca R$ 300 milhões em emendas para Censo

    Volume de recursos é insuficiente
    Volume de recursos é insuficienteLucas Lacaz Ruiz/Estadão Conteúdo/15.ago.2010

    O governo pretende buscar R$ 300 milhões em emendas parlamentares para complementar o orçamento do Censo Demográfico 2020, que tem até agora apenas R$ 2 bilhões para levar a pesquisa a campo, segundo apurou o Estadão/Broadcast. O volume de recursos é insuficiente para viabilizar a pesquisa, que é o maior levantamento estatístico do País e custará R$ 2,3 bilhões no ano que vem.

    Censo, que vai a todos os lares brasileiros em 2020, já foi enxugado pela falta de recursos — no formato original, ele foi orçado em R$ 3,435 bilhões, sendo R$ 3,027 bilhões necessários no ano que vem. Mesmo assim, a área econômica do governo enfrenta dificuldades para garantir todo o dinheiro necessário.

    A maior trava é o teto de gastos, que vai crescer apenas 3,37% no ano que vem (variação da inflação em 12 meses até junho deste ano), enquanto despesas obrigatórias como benefícios previdenciários estão avançando mais rápido. Em entrevista ao Estadão/Broadcast neste mês, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, antecipou que os gastos com a Previdência vão crescer R$ 40 bilhões no Orçamento de 2020.

    Diante das dificuldades da equipe econômica, o relator da proposta orçamentária, deputado Domingos Neto (PSD-CE), afirmou que vai discutir com os parlamentares a possibilidade de destinar os R$ 300 milhões que faltam por meio de emendas. Ele disse já ter se reunido com a presidente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Susana Cordeiro Guerra, para tratar do tema:“Ainda não foi nada definido. Sabemos da importância e vamos discutir isso na comissão. É fundamental o sucesso do Censo no ano que vem.”

    A estratégia de buscar recursos de emendas parlamentares para garantir a realização de pesquisas mais caras já foi usada pelo ex-presidente do IBGE Paulo Rabello de Castro. As emendas financiaram parte do Censo Agropecuário 2017, que já havia sido adiado sucessivas vezes pela falta de verba do governo.

    De acordo com uma fonte da área econômica, o valor de R$ 2,3 bilhões para o Orçamento do Censo 2020 já foi definido com o instituto diante da necessidade de deixar a pesquisa mais enxuta em um cenário de falta de recursos. Desde agosto do ano passado a equipe econômica já apontava a necessidade de baratear o Censo como revelou à época o Estadão/Broadcast.

    O instituto fez cortes no questionário e espera assim uma economia com mão de obra, reduzindo o tempo gasto e aumentando o número de entrevistas feitas por recenseador. A contratação de profissionais temporários é o maior custo durante a realização do Censo.

    Se inserir ICMS, reforma tributária fica mais 20 anos, diz senadora

    Simone é presidente da CCJ do Senado
    Simone é presidente da CCJ do SenadoWaldemir Barreto /Agência Senado

    presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), fez um alerta sobre a votação da reforma tributária, em tramitação no Congresso. Ela acredita que a matéria pode avançar rapidamente, desde que não seja inserida a mudança para tributar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) no estado de consumo. “Se quisermos colocar ICMS neste momento, nós podemos ficar mais 20 anos discutindo”, afirmou.

    Em entrevista à jornalista Roseann Kennedy, no programa Impressões, que vai ao ar nesta terça-feira (27), às 23h, na TV Brasil, Simone Tebet defendeu que os parlamentares entreguem uma reforma que mexa primeiro com a unificação dos impostos federais e desburocratize, deixando para o ano que vem a discussão sobre o que fazer com o ICMS.

    “Nós temos dois Brasis, o que produz e o que consome. Esses Brasis nunca vão se encontrar num consenso se o bolo tributário é um só. Na hora de dividir, um perde e outro ganha”, observa, lembrando que ao longo das últimas décadas foi justamente esse ponto que sempre travou a reforma.

    Para a presidente da CCJ é fundamental que os deputados e senadores se debrucem sobre a proposta do governo federal e alterem os pontos necessários. “Eu não conheço uma reforma tributária, mesmo as minirreformas, que não tenham saído em sua essência do chefe do Executivo. Porque são eles que têm os números. Isso não significa que nós vamos chancelar essa reforma. Significa uma sinalização do que é possível e qual reforma, em princípio, o governo quer. Aí sim, tanto a Câmara quanto o Senado colocam musculatura nesse esqueleto”, ressaltou.

    A senadora destacou a necessidade de avançar em várias matérias ao mesmo tempo, para impulsionar o Produto Interno Bruto (PIB) e gerar empregos no país. Ela comemorou a aprovação da MP da Liberdade Econômica e disse que é quase tão importante quanto a reforma tributária, “porque desburocratiza as relações de negócios no Brasil”. Simone Tebet acredita que entre 60 e 90 dias o país já sentirá os efeitos dessa MP, com a criação de novas empresas e vagas de trabalho.

    No momento, segundo ela, o calendário da CCJ está centrado na reforma da Previdência. Nesta semana, a comissão começa a discutir o relatório que será apresentado pelo senador Tasso Jeireissati (PSDB-CE). Após aprovação na CCJ, o debate vai ao plenário e há prazos regimentais a cumprir. Com isso, Simone afirma que “10 de outubro é um prazo extremamente razoável (para a reforma estar promulgada)”.

    Na entrevista à TV Brasil, a presidente da CCJ também manifestou preocupação com o projeto de lei de abuso de autoridade, falou sobre os desafios políticos do país num momento de extremismos e da importância do MDB para unir forças de centro-direita e centro-esquerda. A senadora ainda conta detalhes do seu dia a dia como parlamentar, mãe e esposa.

    Em um ano, ministério respondeu a 11,5 mil dúvidas sobre saúde

    Vacinação é um dos temas polêmicos
    Vacinação é um dos temas polêmicosMarcelo Camargo/Agência Brasil

    O serviço criado pelo Ministério da Saúde para esclarecer boatos e notícias falsas da internet completa um ano nesta terça-feira (27) com 11,5 mil resoluções das 12,2 mil dúvidas.

    Segundo o ministério, o Canal Saúde sem Fake News, por meio do número (61) 99289-4640, esclareceu 104 diferentes notícias falsas (fake news). Entre os principais temas recebidos estão vacinação, falsos cadastros para atendimento no SUS, surgimento de câncer por falta de vitamina, uso excessivo de celulares e curas milagrosas de doenças por meio de alimentos.

    De acordo com o diretor de Comunicação Social do Ministério da Saúde, Ugo Braga, a pasta verificou que, aos poucos, as pessoas estão entendendo a gravidade de espalhar esse tipo de notícia sem qualquer verificação. “A propagação de informação errada sobre saúde é tão grave que pode até matar”, diz.

    A Região Sudeste foi a que enviou o maior número de mensagens; mais de 50% das conversas respondidas foram do Espírito Santo, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.  Segundo o ministério, por meio do canal, também foi possível perceber que na época de vacinação contra a gripe a principal notícia recebida era de uma nova gripe e que o chá de erva doce era a cura para doença. Uma curiosidade é que o número recebe diariamente mensagens sobre uma “bactéria no feijão” e sobre a água de coco para esclarecer se faz bem ou mal para saúde.

    O canal é exclusivo para recebimento de dúvidas sobre notícias falsas e todos os boatos estão disponíveis no site www.saude.gov.br/fakenews. O ministério esclarece que o serviço não deve ser utilizado para dúvidas sobre o funcionamento do SUS (Sistema Único de Saúde). Nesse caso, o material deve ser direcionado à Ouvidoria Geral do SUS, no número 136, ou as secretarias municipais e estaduais de Saúde.

    Temas polêmicos e fake news recebidos pelo Ministério da Saúde:

    1. Vacinação:

    — Vídeo afirmando que a vacinação faz mal

    — Vacina causa autismo

    — Dúvidas sobre a campanha de vacinação do sarampo

    — Nova gripe fatal e a cura pelo chá de erva doce (durante a época da campanha de vacinação)

    — Vacina anticâncer

    2. Cadastro Brasil Sorridente

    3. Câncer é deficiência de vacina B17

    4. Maculopatia (doença na retina) causada por uso do smartphone

    5. Dipirona importado da Venezuela com vírus

    6. Alimentação em geral

    — Cura de doenças como diabetes por alimentos

    — Chás e produtos que curam doenças

    — Limão no copo faz mal

    — Bactérias nos feijões

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