ALTO DO RODRIGUES RN-Eleições 2016: discurso e ruído, por Fábio de Oliveira Ribeiro


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O discurso é um instrumento. Por intermédio dele o homem comunica o bom, o belo e o justo (elogio) ou se esforça para defender alguém ou atacar algo (apologia). O discurso é essencial à Filosofia, ao Direito e à Política e se apresenta de maneira distinta segundo as virtudes e necessidades daquele que o produz e os objetivos que se pretende alcançar. Na esfera do Direito e da Política, o discurso é produzido para convencer.

No campo Político, o discurso “…só se justifica à medida que, através dele, o locutor se situa de modo singular no quadro de informações preexistentes à sua enunciação.” (Argumentação e Discurso Político, Haquira Osakabe, livraria e editora Kairós, 1a. edição, 1979, p. 79). Por isto, “… todo locutor ao enunciar seu discurso se enquadra, independentemente de uma imagem objetiva daquilo que o ouvinte possa saber sobre o referente, na exigência básica de que no mínimo este último é passível de ter um conhecimento distinto do seu.” (Argumentação e Discurso Político, Haquira Osakabe, livraria e editora Kairós, São Paulo, 1a. edição, 1979, p. 79).

Numa democracia ideal, cada político se relacionaria de maneira pessoal e direta com cada eleitor. Mas isto não é nem possível nem desejado numa democracia de massa real como a brasileira, que convoca milhões de pessoas a votar em centenas de candidatos que disputam alguns poucos cargos. Em nosso país o campo político se desdobra em dois: de um lado o candidato se relaciona de maneira pessoal com alguns eleitores (aqueles que detém poder econômico para financiar ou amplificar sua candidatura); de outro ele produz propaganda para ser consumida pela massa de eleitores anônimos com os quais não pode ou não quer se relacionar de maneira pessoal.

Em cada um destes domínios o discurso assume um formato específico. A finalidade é a mesma, mas o conteúdo da mensagem e o meio através da qual ela é transmitida será inevitavelmente diferente. Numa cidade como Osasco, onde moro, os candidatos a prefeito melhor colocados utilizam carros de som e legiões de boqueiros para empunhar bandeiras e distribuir material impresso. Nas ruas, ninguém sabe o que eles acertaram entre si e com as pessoas mais poderosas da cidade que estão financiando suas campanhas. E a maioria dos eleitores sequer se preocupa com a distinção sutil atribuída ao seu voto (que se pretende conquistar com propaganda) e os votos dos eleitores preferenciais com os quais os candidatos se relacionam pessoalmente (a quem prometem realizar esta ou aquela obra, aumentar o preço da passagem de ônibus ou atribuir uma concessão pública, etc…).

Neste exato momento, milhares de carros de som dos diversos candidatos a prefeito de Osasco percorrem as ruas da cidade. Quando eles se cruzam nas vias principais (como ocorreu ontem a tarde embaixo do viaduto metálico próximo à Prefeitura), as mensagens se misturam e o resultado é uma cacofonia ensurdecedora. Numa situação como esta é impossível para os eleitores diferenciar as mensagens ou mesmo entender o que cada candidato tem a falar através de seu carro de som.

É evidente que quando o interlocutor não quer se situar ou não pode se situar no quadro de informações preexistentes dos ouvintes e nem mesmo se preocupa com os conhecimentos distintos que eles possam ter, o discurso se transforma em ruído. Afinal, ao contrário do discurso, o ruído é por definição “Toda perda de informação ou alteração no decurso da transmissão da mensagem…”(Iniciação à Análise Linguística, Martin Riegel, editora Rio, 1981, p. 24).

A democracia brasileira está em frangalhos. E a campanha eleitoral em curso não me parece capaz de restaurar um mínimo de relacionamento pessoal e proveitoso entre a massa de eleitores e os candidatos que disputam os cargos eletivos para atender os interesses daqueles que financiaram ou amplificaram suas propagandas. Quem fizer mais ruído ganhará a eleição. E nos próximos quatro anos, a população será obrigada a ruminar em silêncio o erro que cometeu porque ninguém consegue ou quer se relacionar de maneira próxima e pessoal com ela.

Os gregos criaram a democracia para aproximar as pessoas comuns do poder. A nossa democracia de massa só consegue uma coisa: produzir ruído para manter o povo distante dos cidadãos poderosos que comandam a política ao se relacionar de maneira pessoal com os candidatos. Nesse sentido, não chega a causar espanto o fato do povo não ter resistido ao golpe de estado que levou Michel Temer à presidencia. O ruído é a mensagem… O espaço para o discurso em nossa democracia é muito reduzido, logo ela mesma pode ser facilmente derrubada pelas empresas de comunicação que fazem mais barulho.

As vitórias eleitorais (obtidas por todos os partidos desde 1988 através da produção e difusão de ruído) arruinaram nossa democracia de maneira mais profunda do que a corrupção eleitoral? Esta, meus caros, é uma pergunta dolorosa que eu não ouso responder.

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Levany Júnior

Levany Júnior é Advogado e diretor do Blog do Levany Júnior. Blog aborda notícias principalmente de todo estado do Rio Grande do Norte, grande Natal, Alto do Rodrigues, Pendências, Macau, Assú, Mossoró e todo interior do RN. E-mail: [email protected]

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