Diante dos incontáveis e cada vez mais complexos problemas do mundo contemporâneo, um deles – em especial – chama a atenção pela maneira como vem sendo tratado, ou melhor, pela maneira como não vem sendo tratado: o que fazer com os idosos, aqueles que já não produzem e que passam a depender das suas reformas e aposentadorias? Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, o número de pessoas com mais de 60/65 anos de idade tem crescido muito nas últimas três décadas, com a curiosa e não menos preocupante expectativa de que em 2025 o Brasil ocupe o sexto lugar no mundo em número de idosos.
Todos os países, sem exceção, enfrentam o problema.
O que significa envelhecer num mundo em que cada vez mais se valoriza o consumo, o sucesso, o dinheiro e a sobrevivência a qualquer preço? Em um mundo onde a guerra cibernética já não é uma fantasia de ficção científica?
Envelhecer, e perdoem-me o simplismo, é o mesmo que assistir a um filme por várias e repetidas vezes. Sempre vem aquela sensação do “isto aí eu já vi”. Situações que se repetem, mesmo com desfechos diferentes. E ainda bem, não amigo leitor? Porque se o “dejà vu” tivesse sempre o mesmo final, a vida, por melhor que fosse, seria de uma chatice insuportável.
A propósito, a pensadora e escritora francesa Simone de Beauvoir se dedicou ao assunto. Escreveu um ensaio específico sobre o tema com o título “A Velhice”, onde reflete – através da História – sua preocupação com o último estágio da nossa passagem pelo planetinha Terra. Muito embora aborde a matéria sob os mais variados ângulos de muitos dos pensamentos e das atividades humanas, sua conclusão é simples e enriquecedoramente óbvia: viver é envelhecer.
Existem os que não se importam com a velhice, os que fingem em não se importar com ela, os que se preocupam em excesso com o envelhecimento e ainda os que envelhecem sem saber, e que não são poucos. Existem até os que envelhecem naturalmente. Para cada um dos casos serão inúmeros os exemplos com histórias tristes ou bem humoradas, divertidas ou trágicas, exemplares ou patéticas.
Oscar Niemeyer, por exemplo, que morreu após os cem anos de idade, teve um grande amor pela vida e pelos seus semelhantes, mas há o mundo das senhoras e dos senhores praticantes do botox e das cirurgias plásticas. São dois extremos de preocupações, ou não, com o envelhecimento. Há também o velho obsceno, como bem definiu a professora Marilena Chauí há poucos dias a respeito de um colega seu na Universidade de São Paulo. E ela não estava falando de sexo.
Uma coisa é certa: envelhecer é saber se preparar para ser posto à margem da vida social, do trabalho, dos divertimentos, do carinho familiar, do convívio com os mais jovens. Mesmo que muito se faça para tal não acontecer. Para isso a humanidade ainda não encontrou antídotos.
Asilos, casas de repouso, sanatórios, hospitais, manicômios abrigam milhares e milhares de idosos pelo mundo afora. Seres humanos que tiveram a sua utilidade e que num determinado momento a sociedade pede para conferir a sua data de validade. O prazo de vencimento se torna um estigma
O Brasil é um país jovem, pouco mais de quinhentos anos, ao lado de muitos que já ultrapassaram a marca dos três a cinco mil anos. Em relação a esses, sequer podemos dizer que já entramos na adolescência da história da humanidade. E, como os adolescentes, estamos cheios de problemas, procurando nos firmarmos como nação, livre, soberana e desenvolvida economicamente.
Nessa caminhada é preciso pensar seriamente em políticas de amparo e cuidado com muitos daqueles que, de uma forma ou de outra, já não possuem força física e também anímica para enfrentar os problemas do dia a dia. O ano de 2025 já está batendo à porta.
Vamos cuidar desse e de outros grandes problemas do país em relação à qualidade de vida e do bem estar social? Do nosso futuro como país de ponta? Com economia mais estável e instituições realmente democráticas? Ou vamos ficar com essas falsas demonstrações de combate à corrupção, com essa justiça de classe calhorda, de um lado só, apoiada pela ação de policiais e juízes que se consideram acima do bem e do mal, muitos deles tão ou mais corruptos do que os que são presos, julgados e condenados? Dessa cultura acovardada e hipócrita onde eu, minha família e meus amigos somos pessoas do bem e tudo à nossa volta é uma bandalheira só, um verdadeiro mar de lama?
Envelhecer é também viver. Viver para descobrir que um evangélico é capaz de usar a sua fé e a sua igreja para enviar dinheiro para paraísos fiscais e negar tudo isso para seus colegas de parlamento e para o país. Não que isso seja lá grande novidade. É só investigar o que fazem essas Igrejas e Cia Ltda. no Brasil e mundo afora. A novidade é o cinismo e a desfaçatez com que se faz e, sobretudo, o deboche em tentar fingir que tudo não passa de um mal entendido.
Eduardo Cunha deveria colocar no seu Porsche aquele adesivo de que falei no meu artigo anterior: PRESENTE DE DEUS. E o brasileiro um adesivo na lapela: SOU FELIZ PORQUE SOU IDIOTA.
Ou sou só eu que estou envelhecendo?
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Izaías Almada, mineiro de Belo Horizonte, escritor, dramaturgo e roteirista, é autor de Teatro de Arena (Coleção Pauliceia da Boitempo) e dos romances A metade arrancada de mim, O medo por trás das janelas e Florão da América. Publicou ainda dois livros de contos, Memórias emotivas e O vidente da Rua 46. Como ator, trabalhou no Teatro de Arena entre 1965 e 1968.