Blog do Levany Júnior

SÃO GONÇALO DO AMARANTE RN-“Empoderar, dar autonomia, não esconder o código”, por Habemus

Jornal GGN – Em artigo publicado, a startup brasileira recém-lançada Habemus ressalta a importância da autonomia na internet, uma vez que ela é “o símbolo de uma era que tem o potencial de redesenhar as estruturas sociais do futuro”.

Google, Facebook e Twitter, por exemplo, apesar de terem importante papel na forma como a sociedade produz e consome informações, são plataformas que não exponenciam o poder de transformação da internet, já que não possibilitam que os usuários modifiquem seus algoritmos.

De Habemus

Empoderar, dar autonomia, não esconder o código.

A internet foi concebida na década de 1960, em plena guerra fria, como um sistema distribuído de comunicação capaz de sobreviver à uma guerra nuclear. Enquanto a malha de telecomunicação então existente nos Estados Unidos era centralizada, ou seja, toda a transmissão de dados dependia de um único nó intermediário da rede, a internet foi desenhada como um sistema distribuído de comunicação com múltiplos nós equivalentes entre si e capazes de direcionar os dados pelo melhor caminho até seu destino final.

Em uma rede centralizada, existe apenas um único nó responsável por receber e enviar os dados aos destinatários finais. Caso esse nó seja destruído, todo o sistema de troca de dados é inutilizado.

Representação esquemática de uma rede centralizada. Quando o nó principal é destruído, não há mais troca de dados.

Em uma rede distribuída, todos os nós da rede têm a responsabilidade de enviar os dados para um próximo nó que esteja mais próximo do destinatário final. Caso um ou alguns nós da rede sejam destruídos, a capacidade de enviar dados do sistema permanece intacta.

Representação esquemática de uma rede distribuída. Quando um nó é destruído, a troca de dados continua a existir.

É curioso pensar que o arquétipo da rede distribuída – originalmente concebido como artifício puramente tecnológico para tornar o sistema seguro e resiliente – viria a se manifestar de maneira tão evidente meio século mais tarde em uma esfera completamente distinta: as estruturas sociais de comunicação.

O modelo de comunicação a que hoje chamamos de “rede social” pode ser entendido como uma malha de comunicantes (pessoas, empresas, entidades, inteligências artificiais) essencialmente equivalentes entre si. Isso significa que cada nó da rede tem as mesmas possibilidades comunicacionais que qualquer outro. Isso equivale a dizer que um indivíduo e um grande jornal ou um grande canal televisivo têm as mesmas capacidades de comunicar e influenciar outros nós da rede.

Por outro lado, as mídias tradicionais – rádio, televisão, jornais – foram construídas sobre um modelo de broadcasting: alguns poucos nós da rede publicam/produzem informações enquanto os outros apenas as consomem. O fluxo da informação nesta estrutura é sempre unidirecional, do produtor para o consumidor, o que não dá margem para nenhum tipo de interação entre os diversos participantes do sistema.

O modelo de comunicação em rede, ao horizontalizar as relações entre os nós, possibilita um diálogo multidirecional entre todos os participantes: todo e qualquer nó da rede é, ao mesmo tempo, um produtor e um receptor de informações. A cultura globalizada que vivenciamos é altamente dependente da comunicação em rede e das plataformas sociais.

Existe, no entanto, um grande porém: as plataformas sociais de comunicação em rede colocam seus usuários na posição de produtores e consumidores de conteúdo, mas não de estruturas. Os algoritmos que regem a distribuição destes conteúdos estão completamente fora do alcance dos participantes da rede e, como usuários, tudo que nos resta fazer é acreditar que tais algoritmos sempre funcionarão de forma benigna.

Não estamos sugerindo que Facebook, Twitter, Google, etc. estejam se utilizando de truques maquiavélicos e manipulando informações contra os interesses da sociedade – longe disso, a realidade evidencia que estas plataformas cumprem um papel crucial nas dinâmicas sociais contemporâneas, possibilitando a distribuição de informação de maneiras extremamente velozes e horizontais. O problema é que, como bons arquitetos de sistemas (sejam computacionais ou de qualquer outra natureza) sabem, a segurança de um sistema não pode ser avaliada pelos casos de “bom uso”. Um sistema apenas será realmente seguro e resiliente quando previr que tentarão corrompê-lo e criar mecanismos para que diante de tais tentativas mantenha-se estável e seguro.

A pergunta que precisamos nos fazer é: como garantir que a rede seja sempre um meio de comunicação aberto e livre?

 

Uma infraestrutura neutra e radicalmente democrática

A infraestrutura da internet é meramente a camada de transmissão dos dados: são os cabos pelos quais os sinais eletrônicos passam e os decodificadores que os transformam em dados digitais. Ela é indiferente às características (tamanho, tipo, conteúdo) destes dados. Se são imagens, se são arquivos de texto, se são páginas web, pouco importa. Fica a critério dos usuários da rede a construção e direcionamento dos fluxos das informações. É isso que chamamos de neutralidade da rede.

Além disso, hoje toda a informação necessária para desenvolver tecnologia de comunicação baseada na internet está disponível na própria rede. Desenvolvimento de software web é a atividade técnica especializada com maior quantidade de profissionais autodidatas de toda a história da humanidade. De acordo com dados de uma pesquisa do StackOverflow (um fórum de dúvidas relacionadas à programação) envolvendo 26.086 programadores de todo o mundo, 48% dos respondentes afirmaram não ter graduação em Ciência da Computação e 41,8% consideram-se programadores autodidatas.

Respostas da pesquisa do StackOverflow sobre a formação dos programadores. Fonte: StackOverflow.

 

Se aprender a programar o próprio funcionamento da internet é possível apenas utilizando-a e consumindo informações nela disponíveis, temos uma situação muito peculiar: as mesmas pessoas que têm o interesse primário em comunicar-se através da rede são as pessoas que têm a capacidade de desenvolver sistemas de informação para suprir suas próprias demandas comunicacionais.

Essa capacidade de adaptação da internet – a reprogramabilidade da rede – é a chave para explicar a sua explosiva adoção como meio primário de comunicação. Sem essa adaptabilidade, os diversos membros da sociedade não teriam sido capazes de apropriar-se da rede e construir as ferramentas de comunicação que usamos hoje. É por causa dela que temos, por exemplo a Wikipedia, a enciclopédia mais completa já criada, com 5 milhões de artigos (em inglês), escritos ao longo de 15 anos por 27 milhões de contribuintes.

É equivocado entender a internet estritamente como uma tecnologia. Seu potencial revolucionário não está em sua infraestrutura tecnológica, mas na construção social que emergiu a partir desta rede de informação altamente descentralizada e plástica às necessidades de seus usuários. Foi essa estrutura que possibilitou o surgimento de movimentos como a economia criativa, o movimento maker, a sharing economy.

Pensar na internet em termos mais plenos é entendê-la como um modelo de comunicação intimamente ligado aos valores da democracia. É como se a infraestrutura tecnológica sobre a qual nossa sociedade opera hoje fosse mais progressista que as próprias estruturas sociais vigentes. Esse descompasso fica evidente quando a internet penetra no dia-a-dia de populações de países cujos regimes políticos ainda estão muito distantes da democracia, como o que ocorreu, por exemplo, na Primavera Árabe.

A internet é o símbolo de uma era que tem o potencial de redesenhar as estruturas sociais do futuro. O que a máquina à vapor foi para a construção do mundo em que vivemos, a internet é hoje para um futuro ainda repleto de possibilidades e incertezas. Cabe a nós construí-lo.

Nós da Habemus acreditamos neste potencial revolucionário da world wide web e acreditamos que com ele a nossa geração tem em mãos as ferramentas necessárias para construir um mundo mais justo, pleno e, porque não, feliz. E é evidente para nós que a característica da rede que não pode ser perdida – e que deve ser potencializada – é a sua reprogramabilidade por todos que dela fazem parte.

A Habemus é uma plataforma de desenvolvimento web para a geração maker.

Nosso objetivo é prover o ferramental necessário para que mais pessoas sejam e sintam-se efetivamente capazes de desenvolver tecnologias para reprogramar o mundo. Queremos democratizar o desenvolvimento de tecnologia porque acreditamos veementemente que esta é a única maneira de dar concretude ao potencial revolucionário que representa a sociedade em rede.

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