É costume a esquerda se insurgir contra o modelo agrário brasileiro. Tarde, não? Para mostrar alguma erudição, citam autores que bem analisaram a agricultura na metade do século passado, mas baseados em estatísticas rasas, o mundo se reconstruindo no pós-Guerra, blocos políticos polarizados. Tratavam dos ciclos monocultores no Brasil. Não os temos mais. O bonde da demanda mundial passou e a ele adaptamos o Cerrado para atende-la.
Li, praticamente, a todos eles. Na época, me fizeram a favor da reforma agrária. Hoje em dia, sei que ela acabou realizada de forma autonômica pelas próprias condições estruturais e humanas do país.
Precisa de correções, sim, mas agora de cima para baixo e sem anular nada do que já foi construído e nos eleva a um dos maiores países produtores e exportadores do planeta. Maior apoio governamental aos assentamentos, agricultura familiar, tecnologias nacionais de menor custo e impacto ambiental.
De tanto criticar suas nuances, sei que o agronegócio trouxe, traz e ainda trará inúmeros malefícios ao planeta. Como também benefícios. Uns e outros vindos de anseios alimentares, têxteis, madeireiros e combustíveis do consumo humano.
Agregou tecnologia, mas devastou biomas; gerou excedentes, mas não os distribuiu de forma adequada; desbravou fronteiras, gerando polos urbanos modernos, mas acentuou o êxodo e a miséria entre a população rural. Meio que assim: desesperado para fazer xixi, o urbanoide para o carro na estrada e se alivia no acostamento. Feio, não? Nunca saberá se o nitrogênio ali derramado não fará nascer o verde.
Numa dessas peças infantis, toca ainda mais frenético o pandeiro desses senhores citando ser nossa “vocação agrária velhacarias do capitalismo rural”.
E dá-lhe pau na estrutura fundiária, a exportação de commodities e a insegurança alimentar.
Não destrincham o frango para a galinhada mineira. Tacam-no inteiro na água fervente e seguem o óbvio, milhares de vezes aludido, para mostrar nossas mazelas agrárias que, para eles, é só uma: a extensa área plantada com commodities de exportação.
E daí? Tudo o que produzimos no agro, commodities ou não, é realizado por pessoinhas e não robôs. Tem gente produzindo marmelo. Por que não andam para conhece-los?
Vou botar a sangrar:
1. Segundo o IBGE, em Programa Agrícola Municipal (PAM) – 2014, o Brasil plantou 76,2 milhões de hectares e deles tiramos R$ 251,2 bilhões em valor de produção;
2. 77% da área foram plantados com soja, milho, cana e café, pois esse o grosso da produção brasileira que o mercado mundial compra. No mais, são as carnes que, também, se utilizam de proteínas. Comércio. País produtor e exportador não entrou nele se … ferrou;
3. Lembrem-se que há brasileiros que gostam de tofu com molho shoyu, roer milho verde, e chupar cana. Alimentos que ficam nos pandulhos brasileiros, pois;
4. Os demais 23% da área foram plantados com outros 60 produtos. Sessenta! Frutíferas, arroz, feijão, algodão, fibras. Tem caqui, tomate, pimenta-do-reino, mandioca. São 17,2 milhões de hectares que geraram um valor bruto de produção perto de R$ 82 bilhões;
5. Produzíssemos mais desses itens venderíamos para quem? Os mesmos 40 milhões que apenas recentemente foram apresentados ao mercado interno e já se preparam para ir embora?
6. Os 2,7 milhões de hectares plantados com frutíferas rendem 15 toneladas de produto por hectare enquanto a soja média rende 2,9 t/ha. A área com soja é de 30 milhões de hectares. Proporcionaria 450 milhões de toneladas de frutas e não os 85 milhões de soja. O que estamos esperando? Por que não substituir o plantio da oleaginosa por frutas? Deixo a conclusão para os leitores;
7. Querem mais? Como criticar um modelo que se formou autonomicamente até uma proporcionalidade assim: 28% do valor da produção agrícola brasileira (R$) sai da região Sul; 28% do Sudeste; 26% do Centro-Oeste; e 18% do Norte-Nordeste;
Se querem ajudar a agropecuária brasileira, entendam-na como um todo, que inclui homens e mulheres do campo com liberdade para plantarem e criarem o que quiserem. Eles sabem, vocês não.
Divulguem tecnologias de baixos custos e impacto ambiental. Acampem nos gramados de Brasília e peçam ao interino mesoclítico que não extermine o ministério do Desenvolvimento Agrário. Convençam as autoridades monetárias a aumentar o financiamento de custeio, seguro, comercialização e garantam preços mínimos.
Se for difícil sair do WhatsApp, apenas parem de encher o saco do agronegócio e da exportação de commodities. O que precisa mudar não é por aí.
Nota: os dois primeiros vídeos-poesias que enfeitam este texto são da excelente Odonir Oliveira.