A opinião pública em tempos de crise, por Gustavo Rufino


A opinião pública em tempos de crise

por Gustavo Rufino

A perceção de uma sociedade é sempre atípica e pessoal. Uns acreditam que vivemos em um tempo de prosperidade e há saudosistas que creem que o mundo de hoje está bem pior do que já foi. Todos tendem a acreditar que sua visão de sociedade é única e verdadeira. Mas, o Estado democrático de direito no Brasil é mais frágil do que parece e dá sinais claros de fatores que levam a rupturas democráticas e influenciam a percepção da sociedade.

No texto Opinião Pública, Walter Lippmann (1889 – 1974), mostra o quão pouco conhecemos (e nada discutimos) do ambiente onde vivemos. Observamos as notícias que chegam de diferentes fontes de dados e acreditamos que aquilo é um retrato fiel da sociedade em que estamos naquele momento, mais difícil ainda é basear uma visão de outras pessoas, ou principalmente de outra época.

Para quem nasceu entre a redemocratização e o impeachment do, então, presidente da república Fernando Collor de Mello, a sensação passada é a de que vivíamos um período de mais democracia, com avanços importantes. Durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso houve avanços econômicos. Sob o governo Lula o campo social ganhou força. Com Dilma houve luta contra corrupção e a continuação dos programas sociais que mantiveram o PT no governo federal por 14 anos. Até a primeira mulher a assumir o mais alto cargo do Poder Executivo foi destítuida por um Congresso acusado de envolvimento em inúmeros crimes de corrupção, conforme diversas publicações na midia impressa e eletrônica.

A grande verdade é que nossa tradição democrática tem correlação com o momento econômico que o país vive. Em momentos de bonança parece haver um pacto que mantém a estabilidade governamental, mas se há queda no PIB a instabilidade reina. Nos últimos 90 anos, apenas 5 presidentes eleitos completaram o mandato.

Com os dados do PIB desde 1928 em mãos, é possível correlacionar grandes mudanças políticas e sociais que ocorreram no Brasil quase sempre quando a economia passou um mal momento. Repare, quando um presidente caiu, o PIB caiu antes.

Gráfico 1 – Forma de Governo X PIB – Brasil 1928-2016

Fonte: IBGE e IPEA

1930: Fim da República Velha

1964: Ditadura Militar

1984: Redemocratização

1992: Impeachment de Collor

2016: Impeachment de Dilma

 

Assim como pesquisas de avaliação de governos também influenciam no PIB:

Gráfico 2 – Aprovação Presidencial desde 1995

Fonte: IBGE e IPEA

 

O gráfico acima cruza os dados do resultado oficial do PIB x Aprovação presidencial na última pesquisa divulgada pelo Datafolha no ano comparado. Ao analisarmos a correlação entre queda do PIB x Aprovação presidencial é possível identificar que quando o PIB cai há uma tendência de queda na aprovação do presidente, salvo algumas exceções, como mudança presidencial ou contexto político da retração economica. Para tais casos, como ano de 2002 para 2003, não houve queda na popularidade do presidente pela mudança política de governo (transição FHC – LULA). Também não houve no início dos programas sociais do goaverno Lula e em 2009, ano em que a agenda pública estava focada ainda na crise econômica. A responsabilidade da queda não era do governo e sim da crise, e o posicionamento do governo ao estímulo do crédito fez os efeitos da crise serem menores naquele momento. O PIB saiu de -0,64% para 7,49% no ano seguinte. Tal cenário possibilita afirmar que o “monstro” econômico deve ser domado em tempos difícies para manter uma boa aprovação popular.

A Percepção de Uma Realidade Nem Tão Distante

Por que olhamos de forma tao diferente os fatos? Entre tantas variáveis de abordagem, podemos dizer que o entendimento de linha tempo pelo ser humano é confuso. A formação do planeta e a evolução da espécie não é perceptível de forma clara. Temos um pedaço ínfimo de história, 0,004% da Terra para ser mais exato.

Em meio a este emaranhado de caos existe o “nós”, o homo sapiens, sempre dono de si com uma visão limitada do todo, de arrogancia e supremacia sobre os outros seres vivos. Mas, nossa visão do tempo é subjetiva. Isso pode ser melhor traduzido em, pelo menos, 5 fatos que deixam a idéia de tempo mais confusa ainda:

  1. A última execução por guilhotina na França aconteceu no mesmo ano do lançamento de Star Wars, em 1977;
  2. Quando a Warner Bros foi fundada em 1903 o Império Otomano ainda existia, se estendendo até 1929;
  3. A Universidade de Oxford é mais antiga que a civilização Asteca. O centro acadêmico abriu as portas em 1.096. Muitos estudiosos afirmam que os Astecas não iniciaram uma civilização até o começo do século 13;
  4. Os mamutes lanosos ainda estavam vivos quando a Grande Pirâmide de Gizé foi construída.
  5. O 11 de Setembro ocorreu em um momento (2001) mais próximo da queda do Muro de Berlin (1989) do que dos dias atuais (2017).

 

Analisar o tempo de certa forma é assustador porque bárbaries aconteceram e acontecem ainda hoje em diferentes lugares do mundo. A África do Sul derrubou o regime de Aparthied apenas em 1994, após anos de luta de Nelson Mandela. Um tempo onde toda a “geração Y” já havia nascido, por exemplo.

Que tempo é esse do momento político do Brasil? Dois anos de recessão econômica, uma presidente impeachmada por “manobras fiscais” (ou seriam jurídicas?) abre espaço para que assuma o vice, que hoje tem a menor taxa de aprovação da história: 3%, segundo a última pesquisa divulgada pelo Instituto Vox Populi, em 05 de junho de 2017. Tudo isso não abre margem para obscuridade?

Ainda sob a luz dos holofotes, a delação premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista atinge em cheio o presidente Temer e o Senador Aécio Neves, que foi afastado do Senado. Joesley Batista, protegido pela Procuradoria-Geral da República (PGR) sai do país para cumprir acordo de delação na Five Avenue in New York, entregou uma gravação que parece não ter fim, piorando em muito tempestade política em Brasília. Entre outras partes do aúdio, Temer (o vice, agora presidente com 3% de aprovação) avaliza a continuidade na compra da silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (grande negociador do impeachment de Dilma), enquanto Aécio (naquele momento da gravação, presidente do PSDB, que “só para encher o saco do PT” entrou com ação de impugnação da chapa vencedora da eleição 2014, dando inicio a maior crise politica e econômica da historia recente)  pede R$ 2 milhões a Joesley sob a justificativa de pagar despesas com advogados para sua defesa na Lava-Jato. Independente do que vai acontecer aos “investigados”, resta-nos não perder os fatos de vista e a seriedade na análise.

Um Novo Brasil Floresce?

“A verdade é filha do tempo”, e com este pensamento devemos olhar o presente para construir um futuro. Tem-se uma janela ótima para reconstruir o país e pactuarmos agendas progressistas, ao mesmo tempo que pode-se eleger alguém que flerta com o discurso nacionalista radical ou de extrema direita, com ares de Silvio Berlusconi pós a Operação Mãos Limpas, na Itália nos anos 90.

Há esperança e onde há esperança há vontade de mudar. O povo brasileiro é tão honesto quanto qualquer outro povo do mundo. Sabe-se que não é representativo do universo da população, mas a maioria das pessoas que conheço é honesta. Portanto, me recuso a acreditar que a corrupção é de toda uma população. O debate está relativizado, como se todos fossem corruptos a medida que cometam qualquer delito, inclusive pagar alguém para segurar uma vaga nos escassos espaços de estacionamento de carros dos grandes centros urbanos, por exemplo, como já mostraram matérias de TV ou pesquisas de opinião.

Há um indignação com a corrupção. Tal fato mostra que chegou o momento de dar um basta, porém é preciso ter cuidado. É preciso entender que não existe salvadores da pátria. O Brasil de hoje é muito melhor que o Brasil de 20 anos atrás. E isso não é responsabilidade de político algum. É responsabilidade do povo trabalhador, batalhador, que luta todos os dias por um lugar melhor para seus filhos crescerem.

Admitir que o país têm problemas é o primeiro passo para criar a mudança, uma revolução social, educacional e urbana. Mas, ela começa a medida que mudamos nossas ações, nossa percepção sobre a realidade, nossa consciência sobre os reais problemas que atingem a sociedade. Exigir mais ética de todos, para criar a sociedade que sonhamos viver é mais que um direito. É um dever de cidadãos livres.

Em que pese todo o desgaste da crise politica econômica e social, estamos assistindo a morte de algo no mundo político. Ainda é difícil projetar cenários por conta da ininterrupção de alguns processos, como a Operação Lava a Jato, ainda está apurando fatos. Sabe-se ainda que há potenciais candidatos à presidencia na mira da Polícia Federal, o que torna mais difícil o desafio de apurar todos os envolvidos em corrupção no país. Entretanto, se depender do desejo e esperança da população, o Brasil encontrará o caminho da ética, da dignidade, dos direitos civis e humanos respeitados, onde o “jeitinho brasileiro” não seja mais tolerado. Estes novos caminhos deverão trazer prosperidade para todos, disso não podemos abrir mão. Sim, é possível mudar. Basta que disputemos de fato o jogo politico, onde a opinião publica esclarecida é determinante na definição das regras do jogo.

Gustavo Rufino – Publicitário. Pós graduando em Opinião Publica e Inteligência de Mercado/FESPSP. Artigo para disciplina: Opinião Pública e Pesquisa Eleitoral, profª Ma. Jacqueline Quaresemin

 

Referências Blibliográficas

LIPPMANN, Walter – Tradução  e Prefácio de Jacques A. Wainberg. – Petrópolis. RJ 2008.

http://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Neurociencia/noticia/2014/02/como-funciona-nossa-percepcao-de-tempo.html

http://brasil.elpais.com/brasil/2017/05/16/opinion/1494946413_669223.html

http://brasil.elpais.com/brasil/2016/11/01/internacional/1478010009_616978.html

https://oglobo.globo.com/brasil/grampo-revela-que-aecio-pediu-2-milhoes-dono-da-jbs-21353924

http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,joesley-e-wesley-terao-imunidade-completa,70001792519

http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160316_lavajato_dois_anos_entrevista_lab

http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2016/04/11/avaliacao-presidente-dilma.pdf

http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2013/05/02/aval_pres_20122010.pdf

http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2013/05/02/aval_pres_15122002.pdf

http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?vcodigo=ST12

http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/lista_tema.aspx?op=1&no=1

http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/lista_tema.aspx?op=1&no=1&nome=brasil

http://epoca.globo.com/ideias/noticia/2016/04/como-o-brasil-entrou-sozinho-na-pior-crise-da-historia.html

http://brasilescola.uol.com.br/historia/quantos-golpes-estado-houve-no-brasil-desde-independencia.htm

http://www.porque.com.br/quando-um-presidente-cair-repare-o-pib-caiu-antes-por-que/

http://www.porque.com.br/por-que-o-impeachment-de-dilma-pode-ser-bom-ou-ruim/

http://www.porque.com.br/fim-da-era-dilma-2-porques-e-um-1-diagnostico/

 

 

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Levany Júnior

Levany Júnior é Advogado e diretor do Blog do Levany Júnior. Blog aborda notícias principalmente de todo estado do Rio Grande do Norte, grande Natal, Alto do Rodrigues, Pendências, Macau, Assú, Mossoró e todo interior do RN. E-mail: [email protected]

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