Quando se fala em amor nada consegue se comparar ao amor que Deus direcionou ao homem desde a criação do mundo. Aliás, antes da criação do mundo. Pois é certo que o Criador, antecipando-se ao nascimento físico do homem no desenrolar do processo da criação, investira um bom tempo no planejamento de sua obra. Ocupação, atividade, digamos assim, traduzida como gesto de puro amor, qual artista que tem sua obra em alta conta desde a idéia inicial, desde o momento primeiro de sua concepção, mesmo não conseguindo divisá-la, quando conclusa, em sua total grandeza. Por outro lado, se observarmos atentamente para a “máquina humana”, veremos, pela perfeição de sua criação, manifesto no encadeamento preciso de seus tecidos, órgãos, membros, pela capacidade de raciocinar, de formular idéias, de fazer escolhas, ser ação genuinamente amorosa o ato autoral que produziu o homem.
Como também podemos catalogar como gesto amoroso perfeito o esmero em trazer o homem ao cenário da vida na qualidade de herdeiro e detentor de um território inteiramente seu e capacitado, integralmente, a provê-lo de todos os itens necessários à sua subsistência. “Um jardim para cultivar e guardar”, com está escrito no Gênesis. Além do mais, não podemos nomear de outra forma – que não seja como do mais puro amor – o ato de Deus dotando o homem de livre arbítrio, atributo que agregou ao ser humano uma qualidade única em toda a natureza e que fê-lo construtor do seu próprio destino. Ou que título se pode dar ao ato daquele que fez de sua criação um ente livre, instrumentalizado, inclusive, da condição de amá-lo ou odiá-lo de acordo com a sua vontade? Quem chegaria a tanto? Quem daria condições de vida a alguém capacitado a voltar-se contra seu criador na medida em que assim o desejasse?
E Deus não ficou somente nisso. Tempos depois de dar ao homem todas as condições de viver, com Ele, uma existência de comunhão, de harmonia, de paz – tendo o mesmo homem, ao contrário, escolhido o caminho do pecado por livre e espontânea vontade – se fez homem na pessoa do Senhor Jesus Cristo para, através do sacrifício de sangue, quitar a fatura, a nota promissória de nossa dívida para com Ele desde os tempos de Adão. Atentem bem: sacrifício Dele; pecado nosso. Só nosso. E, da mesma forma que das vezes anteriores, agindo em amor genuíno e desinteressado, inaugurou, com a morte e ressurreição de Jesus, um novo tempo. Não mais baseado em sacrifícios, em ordenanças, nem em pesadas responsabilidades, mas em troca do exercício da fé, que, em última análise, quando praticado, transmuda-se, pelo conceito divino, em atitude da mais genuína doação e do mais puro amor.
E como se concretiza, como se realiza o amor de Deus em nossas vidas? Ou por outra, que efeitos são visíveis em nós em função do seu amor? Afinal, se este é um ato fundamental de Deus para o relacionamento salutar entre os homens, algo deve surgir, em nós, para testificar os seus efeitos. Este mistério é esclarecido pelo apóstolo Paulo em Gálatas 5.19-22: “as obras da carne são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçaria, inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, dissensões, heresias, invejas, homicídios, bebedices, glutonarias. Mas o fruto do Espírito é: caridade, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança”. As primeiras obras atestam a ausência de Deus; já as segundas sinalizam, em nós, a prevalência do seu amor, sua eficácia, alterando nosso caráter, nossas atitudes e nosso relacionamento com o próximo. Uma nova vida, enfim. Inteiramente nova. E amorosa.