MOSSORÓ RN-Sobre os sacrifícios que Dilma pode e deve realizar, por Fábio de Oliveira Ribeiro
Quando Lula assumiu o poder ao ser eleito pela primeira vez, ele gozava de imenso capital político. FHC saiu de cena como imensa rejeição e soterrado por denuncias de corrupção (pritavataria tucana, compra da emenda que possibilitou seu segundo mandato, início do escândalo da Petrobras, etc…). Lula poderia ter colocado um ponto final na carreira de FHC e explodido o PSDB ordenando um pente fino nas ações governamentais dele e de seus aliados, mas não fez isto.
Talvez o petista tenha intuído que ao atacar o adversário poderia fortalecê-lo. Talvez fosse ingenuo o suficiente para acreditar que poderia contar com o apoio eventual da bancada do PSDB na Câmara dos Deputados. Tendo vivenciado o que ocorreu com Jânio Quadros, talvez Lula tenha concluído que não deveria enfiar a faca até o cabo no barriga do adversário. Quem costuma fazer isto ica exposto à máxima fragilidade político-partidária no momento de maior necessidade de apoio (foi o que ocorreu quando Jânio Quadros renunciou acreditando que poderia voltar ao poder fortalecido).
O fato é que em nome de um suposto republicanismo, Lula evitou o revanchismo ou não quis transformar FHC numa vítima sacrificial. Numa República, contudo, ninguém deveria ficar acima da Lei. E o fato de FHC e sua quadrilha ter sido poupada é a verdadeira gênese da crise que atormenta o governo Dilma Rousseff. Ela não pode atingir FHC, que enfia a faca na barriga de Dilma Rousseff porque sabe ser beneficiário da prescrição por falta de ação estatal oportuna contra os crimes cometidos no governo dele.
A vítima sacrificial poupada por Lula se esforça agora para sacrificar a herdeira política do ex-presidente. Se Dilma Rousseff cair, o pais mergulhará no caos e até mesmo as pretensões eleitorais de Lula serão comprometidas. Isto se ele mesmo não for totalmente enredado pelas conspirações jornalístico-policiais que tem sido tecidas para prendê-lo impedindo sua candidatura. Sujar a ficha de Lula seria a maior vingança de FHC, cuja ficha ficou limpa justamente porque não foi perseguido depois que passou a faixa para ele.
Política e religião são fenômenos diferentes e, paradoxalmente, semelhantes. Os religiosos olham para o passado, os políticos olham para o futuro, mas ambos atuam no presente para organizar, suavizar e pacificar a vida em sociedade. Política e religião são, portanto, os dois espaços criados pelos homens para permitir que eles convivam uns com os outros de maneira estável a fim de que possam criar seus filhos e, eventualmente, desfrutar seus netos.
Muito embora o sagrado (campo da religião) e o profano (campo da política) estejam separados, na Cidade Antiga ambos caminhavam juntos. A autoridade do líder que deveria comandar homens e não poderia obter a sujeição de todos mediante violência, nascia tanto da política quanto da religião. Por isto, não era incomum a mesma pessoa transitar entre os dois campos. Júlio Caesar foi eleito Consul de Roma, mas antes disto ele foi Flamen Dialishttps://pt.wikipedia.org/wiki/Fl%C3%A2mine_dial. Aquele que um dia foi encarregado de organizar as festas e os sacrifícios em honra de Júpiter organizaria exércitos e sacrificaria milhares de homens durante a Guerra da Gália e na Guerra Civil. Não causa estranhamento o assassinato de Júlio Caesar no Senado ter se revestido de um caráter expiatório e, portanto, sacrificial e religioso.
“…como bem mostrou R. Smith, o puro e o impuro não são contrários que se excluem, mas dois aspectos da mesma realidade religiosa. As forças religiosas se caracterizam por sua intensidade, sua importância, sua dignidade e por conseguinte são separadas. É isso o que as constitui, mas o sentido no qual são exercidas não é necessariamente predeterminado por sua natureza. Elas podem ser exercidas tanto para o bem quanto para o mal, o que depende das circunstâncias, dos ritos empregados etc. Assim se explica como o mesmo mecanismo pode satisfazer necessidades religiosas extremamente diferentes. Ele tem a mesma ambiguidade das próprias forças religiosas. É apto ao bem e ao mal; a vítima representa tanto a morte quanto a vida, a doença e a saúde, o pecado e o mérito, a falsidade e a verdade. Ela é o meio de concentração do religioso: exprime-o, encarna-o, transporta-o. É agindo sobre ela que se age sobre ele, que se dirige o religioso, seja atraindo-o e absorvendo-o, seja expulsando-o e eliminando-o. E explica-se do mesmo modo que, por procedimentos apropriados, essas duas formas da religiosidade possam se transformar uma na outra e que, em alguns casos, ritos que parecem opostos sejam às vezes quase indiscerníveis.”(Sobre o Sacrifício, Marcel Mauss e Henri Hubert, editora Cosacnaify, 2013, São Paulo, p. 66-67)
José Dirceu foi condenado sem provas, porque não provou sua inocência, com base na literatura e sob a influência evidente de uma teoria jurídica alemã que, além de ter sido distorcida, não se ajusta muito bem aos princípios constitucionais do direito penal e do direito processual penal. Nenhum tucano foi julgado da mesma forma que ele. Portanto, podemos concluir que José Dirceu foi sacrificado http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/jose-dirceu-a-vit….
O sucesso do sacrifício de José Dirceu parece ter animado os mestres que movimentam a cordinhas da oposição. Eles se empenham agora para sacrificar Dilma Rousseff e Lula. Sacrificariam a própria democracia se tivessem maioria no STF.
No Brasil, política e religião voltaram a caminhar juntas. Mas a finalidade desta estranha reunião do sagrado e do profano promovida pelo PSDB (um partido que se diz laico) não é unir o país e sim provocar o oposto. Aqueles que sacrificam os líderes do povo querem, na verdade, fazer com que o povo sacrifique a si mesmo numa Guerra Civil. Talvez esteja na hora de Dilma Rousseff retirar as luvas e exercer o poder em que está investida. Nunca antes no Brasil a vida de tantos e a preservação da unidade territorial do país dependeu do sacrifício de algumas aves agourentas e envelhecidas.
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