Mossoró RN; Alvo das rebeliões, diretora diz que Alcaçuz parecia shopping: “Não havia limites”
Repórter
Durante os sete dias de crise no sistema penitenciário do Rio Grande do Norte – começou no dia 11 e terminou no dia 18 de março – a principal reivindicação dos detentos que participaram dos motins e rebeliões era a saída de Dinorá Simas da diretoria da Penitenciária Estadual de Alcaçuz, maior unidade prisional do RN, que fica no município de Nísia Floresta, Grande Natal. Entretanto, mesmo diante da situação, Dinorá se negou a entregar o cargo. Agora, com a situação se acalmando, ela resolveu abrir o jogo e falar das dificuldades e de sua história de trabalho diário com alguns dos criminosos mais perigosos do Estado.
Dinorá, que é natural da cidade de Grajaú, no Maranhão, trabalha há 13 anos no sistema prisional do Rio Grande do Norte. Ele começou como agente penitenciária no Complexo Penal Dr. João Chaves, foi diretora do CDP da Ribeira e também titular da Coordenadoria de Administração Penitenciária (Coape). Em Alcaçuz, a primeira oportunidade aconteceu em 2012, quando se tornou a primeira mulher a assumir o comando da unidade. Apesar de ter enfrentado diversos problemas ao longo dos anos, nada se comparou ao que ela teve que encarar nas últimas semanas: os dias de rebeliões e motins em 16 presídios potiguares, além de cinco ônibus queimados em Natal por ordem dos detentos. Tudo isso tendo como uma das principais reivindicações a saída de Dinorá da diretoria de Alcaçuz.
Mãe de quatro filhos, ela conta que teve que se isolar quase que completamente dos familiares. “Durante essa crise no sistema penitenciário, se eu falei duas vezes com a minha família foi muito. Fiquei em casa sozinha, pois tinha que me dedicar completamente ao que estava acontecendo. Além disso, eu tinha que garantir a segurança dos meus familiares”.
Questionada se em algum momento pensou em entregar o cargo para tentar conter a onda de rebeliões, Dinorá disse que não. “Se o Governo tivesse me tirado, eu iria aceitar, pois sou funcionária. Mas entregar o cargo eu não faria. Em um momento de crise, mudanças assim não devem acontecer. O Estado e meus companheiros de profissão, os agentes penitenciários, precisavam de mim e eu não podia abandoná-los em um momento como esse”, disse a diretora de Alcaçuz, que ainda deixou no ar uma possível “mudança de vida” em um futuro próximo. “Vamos esperar a poeira baixar um pouco. A situação ainda está sendo totalmente controlada. Quando tudo isso passar, irei pensar no que fazer”.
Sobre os motivos que teriam levado os detentos a pedirem que ela saísse de Alcaçuz, Dinorá afirmou que as diversas apreensões que vêm acontecendo na unidade têm incomodado muitos apenados. “Na verdade eu faço de tudo por eles (detentos). Se eles precisam de alguma coisa, que faço de tudo para conseguir. Acredito que o problema maior é que estamos fazendo muitas apreensões em Alcaçuz e isso não é bom para a ‘atividade’ deles”.
Com 13 anos de serviços prestados e em contato direto com centenas de detentos, as ameaças também fazem parte da vida da maranhense. A situação piorou quando ela assumiu Alcaçuz, em 2012. “Quando cheguei, Alcaçuz parecia um shopping, com os presos à vontade, sem limite algum e quase nunca eram revistados. Mudei isso com muita luta e coragem. No começo, eles (presos) ficaram chateados. Recebi algumas ameaças sim, mas em geral eram bilhetes e informações de que os detentos estavam me ameaçando. Só que isso nunca me abalou. Sempre continuei trabalhando da mesma forma”. Um dos episódios mais graves contra Dinorá aconteceu em maio de 2013, quando uma casa de praia de propriedade dela, foi queimada. Segundo informações da polícia, criminosos atearam fogo e picharam as paredes da residência com inscrições de uma facção criminosa.
Embora tenha ciência das dificuldades que o cargo de diretora de um presídio como Alcaçuz traz, Dinorá Simas acredita que o trabalho poderia ser facilitado caso os INVESTIMENTOS no sistema prisional fossem feitos de maneira mais rápida. “Hoje o sistema prisional do Rio Grande do Norte tem muitos problemas estruturais e também de equipamentos. Já é complicado manter a paz em presídios, imagine sem as condições ideais. Precisamos de equipamento de raio-x nas revistas. Também é preciso investir em pessoal, o efetivo de agentes penitenciários é muito pequeno para tantos detentos”.
Vida pessoal afetada
Com 57 anos de idade, até 2002 Dinorá Simas sequer pensava em seguir a carreira de agente penitenciária. Até então recebia uma generosa pensão do ex-marido, de quem separou em 1995. “Quando eu separei, eu tinha apenas o primeiro grau. Depois investi nos estudos e em 2002 resolvi fazer o concurso para agente. Passei e até hoje não me arrependo da profissão que escolhi”.
Formada no curso de Administração, a diretora de Alcaçuz também estava fazendo faculdade de Serviço Social, mas as jornadas de trabalha, muitas vezes beirando as 24 horas por dia, impediram que ela concluísse o curso. “A minha profissão ocupa boa parte do meu tempo. Sempre tento fazer alguma outra coisa, mas infelizmente não tenho tempo. Como falei anteriormente, muitas vezes vejo minha família bem menos do que eu gostaria. Tenho que abrir mão de algumas coisas para seguir na minha profissão”.
Mesmo com todas as dificuldades e das vontades que tem que abdicar, a atual diretora de Alcaçuz disse que a profissão traz muitas alegrias. “De maneira alguma eu me arrependo da profissão eu escolhi. Eu que quis seguir esse caminho, não foi ninguém que me obrigou. Sei que o trabalho que eu faço é muito importante para a sociedade. O trabalho que fazemos nos presídios tem um reflexo direto na vida da população.
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