Apesar dos vários questionamentos jurídicos aos quais está sendo exposto nos últimos meses, o deputado estadual Gilson Moura, do PROS, tem seguido firme no intuito de buscar a reeleição na Assembleia Legislativa do RN. Tanto é assim que na tarde desta sexta-feira, o parlamentar teve seu nome homologado pelo partido como candidato no pleito de outubro. Porém, na mesma tarde de sexta-feira, Gilson Moura recebeu a notícia de que a Justiça Federal do RN, baseado nesses questionamentos jurídicos, determinou o afastamento dele da Assembleia. Gilson é acusado de improbidade administrativa, superfaturamento e beneficiamento com cargos fantasmas.
O afastamento foi garantido por meio de quatro decisões liminares. A JFRN determinou, também, a indisponibilidade dos bens de Gilson Moura e outros seis envolvidos no esquema da Operação Pecado Capital. A notícia foi divulgada pelo Ministério Público Federal, auto da ação, enquanto Gilson Moura estava no palanque montado no ginásio Nélio Dias, na zona Norte de Natal, apoiando os demais candidatos do partido e também a chapa formada por Henrique Eduardo Alves, candidato a governador; Wilma de Faria, candidata ao Senado; e João Maia, candidato a vice.
Segundo o MPF, as peças incluem desde casos de “funcionários fantasmas” e obras superfaturadas, até empresas contratadas pelo Instituto de Pesos e Medidas (Ipem/RN), durante a gestão de Rychardson de Macedo, entre 2007 e 2010, e que prestavam serviços ao parlamentar. O judiciário já acatou os pedidos liminares de afastamento e de indisponibilidade nos casos que incluem contratação irregular de empresas de pesquisa pela autarquia, para uso do deputado (0802873-90.2014.4.05.8400); contratação com “funcionários fantasmas” de pessoas relacionadas aos principais diretores do instituto (0802872-08.2014.4.05.8400) e ligadas à antiga emissora onde o deputado trabalhou (0802878-15.2014.4.05.8400); e ainda das irregularidades cometidas nas obras de reforma e adequação de uma sala para a criação do telecentro do Ipem (0802869-53.2014.4. 05. 8400).
Os seis outros envolvidos nos processos cujas liminares já foram concedidas são o ex-diretor do Ipem-RN, Rychardson Macedo; além de Márcia Câmara de Figueiredo, Fernando Aguiar de Figueiredo, Merle Ranieri Ramos, Oldair Vieira de Andrade e Adalucia Barreto de Oliveira.
NOVAS AÇÕES
As quatro ações nas quais foram concedidas liminares integram um grupo de 11 apresentadas agora em junho pelo Ministério Público Federal, todas assinadas pelo procurador da República Rodrigo Telles. As informações contidas apontam que todo o valor desviado pelo ex-diretor do Ipem/RN, Rychardson Macedo, era repassado ou dividido com o parlamentar. Os desvios financiavam as campanhas e os interesses políticos de Gilson Moura e também beneficiavam o filho da ex-governadora Wilma de Faria, Lauro Maia; e o advogado Fernando Antônio Leal Caldas Filho.
Os prejuízos aos cofres públicos apontados nos processos resultam em um volume de R$ 1.657.316,60. Em todas as ações foi requerido, além da indisponibilidade dos bens dos réus, o afastamento do deputado estadual de seu cargo. Cinco delas acrescentam novos réus a irregularidades já apontadas em ações penais e de improbidade apresentadas em 2013, contra outros envolvidos da Operação Pecado Capital. Uma dessas inclui, além de Gilson Moura; os nomes de Lauro Maia e Fernando Caldas Filho.
Os três são apontados como beneficiários do contrato ilegal entre o Ipem/RN e o Auto Posto JR II LTDA., que incluiu fraude, dispensa indevida de licitação e pagamentos indevidos de centenas de milhares de reais. No final de 2013, o ex-diretor Rychardson Macedo e outros envolvidos esclareceram através de delação premiada que Gilson Moura, Lauro Maia e o advogado Fernando Caldas Filho eram os destinatários finais da maior parte dos recursos públicos desviados.
“As declarações prestadas pelos colaboradores confirmaram elementos que apontavam no sentido da participação do parlamentar, do filho da ex-governadora e do advogado em referência no esquema”, destaca o MPF.
ENVOLVIMENTO
As interceptações telefônicas da “Operação Pecado Capital” já indicavam a relação entre Gilson Moura e Rychardson Macedo. O nome do deputado foi mencionado em algumas ocasiões, quando tratavam do esquema de desvio de recursos. Segundo o MPF, além dos telefonemas e dos depoimentos, a participação do parlamentar se confirmou através da quebra de sigilos bancários e nas diligências de busca e apreensão.
Rychardson Macedo foi indicado por Gilson Moura e sua função no instituto era representar os interesses político-financeiros do deputado. “E foi quando ele me disse: ‘Não, Rychardson, veja lá o que é que tem de emprego, o que dá pra gente viabilizar de dinheiro, pra campanha, pra gente poder se capitalizar, porque tem o processo de reeleição e também tem o processo de Parnamirim…’.”, afirmou o ex-diretor, em depoimento.
Inclusive um irmão de Rychardson, Rhandson Macedo, mantinha em seu nome um apartamento de luxo pertencente de fato a Gilson Moura e localizado em Areia Preta. “Gilson não ia botar no nome dele. Ele não costuma botar os bens dele no nome dele”, revelou o ex-diretor do Ipem/RN
Filho de Wilma de Faria também participava do esquema de Gilson
Segundo o Ministério Público Fedral, Lauro Maia, filho da ex-governadora e pré-candidata ao Senado, Wilma de Faria, e Fernando Caldas Filho, as ações do MPF indicam que ambos “atuaram nos bastidores político-administrativos, especificamente no submundo das trocas de favores espúrias e do recebimento oculto de valores ilícitos”. Lauro é advogado e exercia influência no então governo estadual, tendo indicado para o Ipem diversos funcionários, alguns “fantasmas”.
Fernando Caldas Filho é parente e foi sócio de Lauro Maia entre 2006 e 2012, em um escritório de advocacia. O MPF aponta que Fernando cumpria o papel de intermediário entre Lauro e Rychardson Macedo. Caberia a ele levar para o diretor do instituto os nomes dos funcionários a serem nomeados, de acordo com a vontade e indicação do filho da governadora.
O advogado também era responsável por realizar com Rychardson Macedo o acerto de contas dos recursos desviados da autarquia. A participação dele e de Lauro Maia foi confirmada através das delações premiadas. O depoimento do ex-diretor reforçou que, além da indicação de funcionários, os dois recebiam dinheiro desviado principalmente por meio do superfaturamento de um contrato de locação de veículos e outro de fornecimento de combustíveis.
CONTRATOS
Sobre o contrato de locação, Rychardson Macedo declarou em depoimento que o Ipem necessitaria de cinco carros e foi aconselhado por Fernando Caldas Filho a contratar 12, sendo que sete ficaram parados, além de uma caminhonete igualmente não utilizada. Os recursos desviados ficavam com o advogado e Lauro Maia, que complementavam a “cota” com parte de outro contrato superfaturado, o de combustíveis.
Rychardson Macedo fechou um acordo com o administrador do Auto Posto JR II, Zulmar Pereira de Araújo, pelo qual os veículos seriam abastecidos e no final do mês o empresário expediria uma nota fiscal em valores muito acima dos reais; descontaria R$ 1 mil e o valor do combustível efetivamente gasto; “devolvendo” o restante ao então diretor do Ipem.
Os dois contratos resultavam em mais de R$ 30 mil mensais para os envolvidos no esquema e somente o de combustíveis gerou prejuízo de R$ 634.900,36 aos cofres públicos. “Peguei o da locadora e do posto, já dava uns trinta e pouco. E fiquei na incumbência de todo mês fazer alguns processozinhos pra poder acrescentar o valor, pra dar uma média de uns vinte mil pra eles e vinte mil pra mim e Gilson”, revelou o ex-diretor.
Parte dos recursos obtidos com os “funcionários fantasmas” também era incluído na divisão com o deputado. “(…) como eu tinha o da locação e tinha o do posto, eu tinha que dar vinte mil a Fernando e a Lauro. Então eu tirava uma parte do posto, e com esses laranjas eu complementava pra Gilson e também o restante eu ficava pra mim. Eu tirava por mês lá… Meu salário era cinco mil, eu tirava mais uns dez mil, justamente de laranja”, afirmou Rychardson Macedo.
OBRAS E TERCEIRIZAÇÕES
Quatro das novas ações acrescentam o nome de Gilson Moura dentre os beneficiados por contratações irregulares de reformas e de mão de obra para o Ipem/RN. Uma delas envolve o pagamento de pessoal terceirizado através da FF Construções e Serviços Ltda, as demais reformas da sede do instituto e do galpão do taxímetro, além da construção de um telecentro.
O contrato de terceirização de funcionários e os de obras foram uma das grandes fontes de desvio de recursos públicos na gestão de Rychardson Macedo. “Gilson Moura, com certeza, recebeu de seu ‘testa-de-ferro’ dinheiro proveniente desses contratos”, observa o Ministério Público Federal. De acordo com o ex-coordenador financeiro Aécio Aluízio Fernandes, o contrato da FF o permitia fazer pagamentos de valores a pessoas ligadas ao deputado estadual e entregar mensalmente a Rychardson cerca de R$ 29 mil a serem divididos com o parlamentar.
O prejuízo total decorrente da ilegalidade atingiu R$ 364.322,68. As obras de reforma da sede, do telecentro do Ipem e do galpão do taxímetro geraram um desvio total de R$ 261.755,56. Todos esses serviços incluíram inexecução parcial ou total da obra e superfaturamento dos valores, sem contar irregularidades na licitação.