Ministério Público investiga fatiamento de áreas públicas do município sem qualquer critério
MAGNOS ALVES – Editor de Política do Jornal de Fato
As áreas públicas de Mossoró encolheram bastante nos últimos anos. O motivo está sendo o fatiamento de terrenos para a iniciativa privada, associações e entidades religiosas promovido pelo prefeito Silveira Júnior (PSD).
Em um rápido levantamento feito pela equipe do gabinete do vereador Lairinho Rosado (PSB) no Jornal Oficial do Município (JOM), é possível identificar uma dezena de publicações com doações e comodatos de áreas públicas cedidas pelo atual prefeito de Mossoró.
O comodato de terrenos se tornou algo bastante comum na atual gestão municipal. Por meio dele, Silveira Júnior repassou várias áreas públicas à iniciativa privada sem precisar de aprovação na Câmara Municipal. Na prática, o prefeito descobriu uma fórmula para driblar os vereadores.
Somente no Jornal Oficial do Município (JOM) do dia 28 de agosto de 2015, são encontrados três contratos de comodato, beneficiando as empresas Action Fitness Academias e Fardadez Fardamentos Profissionais Ltda, além da Associação Rede Dez de Supermercados, formada por dezenas de empresários de Mossoró e região.
Somente nesses três casos, a área pública cedida por Silveira, sem precisar do aval da Câmara Municipal, totaliza 5.495,99 metros quadrados.
Além dos comodatos, o prefeito também fez várias doações de terrenos com aprovação da Câmara. Atos facilitados pela numerosa bancada que ele contou no Legislativo durante todo o seu mandato. O cenário só mudou nos últimos meses.
Na lista de doações estão imóveis à Igreja Pentecostal Unificados na Fé, construção da capela de Santa Rita de Cássia no bairro Planalto 13 de Maio, Igreja Cristã Evangélica no Vingt Rosado, Igreja Evangélica Assembléia de Deus, Cooperativa de Agricultores e Agricultoras e Familiares de Mossoró e Região, além de 27 mil metros quadrados no Distrito Industrial I para a empresa Leão Coroado Empreendimentos Ltda..
Outros comodatos e doações foram celebrados por Silveira, mas a reportagem do JORNAL DE FATO não conseguiu localizá-los durante a pesquisa no JOM.
Lairinho Rosado considera um absurdo Silveira ceder área pública por meio de comodato. “O único objetivo é que não passe pela Câmara, para que a sociedade não tome conhecimento”, afirma o vereador.
O vereador Genivan Vale (PDT) observa que a concessão de terrenos passando pela Câmara representa, ao mesmo tempo, maior visibilidade ao que está sendo feito. “Existem critérios estabelecidos, como, por exemplo, geração de empregos”, defende.
A reportagem tentou falar com a Prefeitura de Mossoró sobre os diversos casos de terrenos doados que estão sendo apurados pelo Ministério Público Estadual (MPE), mas a secretária municipal de Comunicação, Luziária Machado, não atendeu as ligações.
Silveira também tenta fazer permuta de área pública
Além das doações e comodatos, o prefeito Silveira Júnior também está tentando usar uma outra modalidade de procedimento para repassar uma área pública. Trata-se de uma permuta que beneficiaria a empresa Escola de Enfermagem Nova Esperança Ltda (FACENE). O projeto está em discussão nas Comissões da Câmara e é cercado de polêmica.
Embora conte com a dedicação do líder do governo na Casa, vereador Claudionor dos Santos (PEN), a permuta de uma área no Abolição por outra – bem mais valiosa – no Nova Betânea sofre grande rejeição de boa parte dos parlamentares, incluindo os que, oficialmente, ainda fazem parte da bancada governista.
Vereadores da bancada de oposição apontam dois pontos para rejeitar o projeto: trata-se de conduta vedada para o período pós-eleições; e a lei municipal de 2008 que determinou a doação do imóvel localizado no Abolição para a Facene impede que ele seja permutado.
Mesmo assim, Silveira tem insistido para que a permuta entre em votação no plenário. Para isso, ele mobilizou secretários até a Câmara para tentar convencer os vereadores. No entanto, ele ainda não conseguiu.
Terreno é cercado antes mesmo de doação oficial
O fatiamento de áreas públicas em Mossoró chegou ao ponto de um terreno ser cercado pelo beneficiário antes mesmo de a doação ser oficializada pela Prefeitura de Mossoró. Um extenso imóvel localizado no bairro Nova Betânea já foi cercado, mas não se tem conhecimento de que Silveira tenha feito o processo de comodato ou doação.
Informações não oficiais apontam que a entidade beneficiada é a Associação de Panificadores de Mossoró e Região Oeste (APASMO), presidida por Damásio Melo, irmão do presidente do PRB em Mossoró, Fernandinho das Padarias, partido que apoiou a reeleição de Silveira e, depois da sua desistência, migrou para o candidato Tião Couto (PSDB), acompanhando o prefeito.
Segundo os moradores das proximidades, o desejo é que fosse construída uma área de lazer no terreno. Os moradores afirmaram ainda que o imóvel foi cercado “da noite pro dia”.
A reportagem tentou falar com Damásio Melo, mas ele não atendeu as ligações e nem respondeu às mensagens no WhatsApp.
Empreendimento comercial está sendo erguido no Corredor Cultural
A paisagem do Corredor Cultural de Mossoró está sendo alterada com a construção de um empreendimento comercial na Avenida Rio Branco. Embora proibido por lei municipal, o empreendimento avança rapidamente e, de acordo com especulações, será inaugurado ainda neste ano de 2016.
A obra pertence ao empresário Genivan Josué Batista, do grupo A Construtora, e está sendo possível graças a um acordo nebuloso feito pela ex-prefeita Cláudia Regina (DEM) com um grupo de empresários e que envolve ainda a empresa A & C.
No acordo obscuro, que contou com o aval do procurador do Município à época, o advogado Olavo Hamilton, um grupo de empresários cedeu um terreno para a instalação da A & C em Mossoró e, em troca, ficou com uma grande área na Avenida Rio Branco, em pleno Corredor Cultural.
O MPE está com procedimento aberto apurando a permuta de mais uma valiosa área pública. No momento, está sendo analisado o documento que foi apresentado como escritura do imóvel onde está sendo erguido o empreendimento comercial. Uma primeira escritura foi apresentada, mas reprovada pelo MPE.
Representante de comerciantes que estavam instalados na área que Genivan Josué Batista afirma ser dele, o advogado Evânio Araújo já entrou com várias ações para parar a obra em andamento, mas ainda não teve resposta da Justiça.
MP pode entrar com ação de improbidade contra Silveira
Vários procedimentos estão em andamento no MPE investigando o comodato e doação de terrenos públicos por Silveira Júnior. Mas, no momento, o caso que pode complicar mais o prefeito é o envolvendo a doação e, agora, a tentativa de permuta de imóvel para a Facene.
A promotora do Patrimônio Público, Micaele Fortes Caddah, não descarta entrar com uma ação de improbidade administrativa contra Silveira.
O motivo é que o prefeito não provou que adotou as medidas recomendadas pelo MPE para reversão do terreno doado pelo Município à Facene no Abolição.
Silveira sequer respondeu os questionamentos do MPE, o que levou Micaele Fortes a entrar com um mandado de segurança na 2.ª Vara da Fazenda Pública para que ele seja obrigado a prestar os esclarecimentos necessários para a conclusão das investigações.
O MPE insiste que a doação de terrenos tem de ser feita por meio de licitação, para a parte interessada que apresentar as melhores condições para o Município e a sociedade. “O administrador não pode escolher de forma subjetiva. Tem que ter o procedimento licitatório”, afirmou a promotora.
Micaele Fortes confirmou que existem vários procedimentos em andamento apurando se a Lei das Doações realmente foi cumprida. “A lei prevê que várias coisas precisam ser cumpridas”, observou.
Silveira pressiona vereadores por permuta
Silveira Junior insiste em permutar um terreno para a Facene antes de deixar o cargo de prefeito em 1.º de janeiro de 2017. Para isso, ele pressionou vereadores de sua bancada em reunião realizada na última sexta-feira (25) na Câmara Municipal.
Na oportunidade, o prefeito também fez campanha pela aprovação do projeto que cria a Agência Mossoroense de Regulação de Serviços Públicos (AMR). Boa parte dos vereadores rejeita os dois projetos, por questões legais e políticas.
É mínimo o número de parlamentares que permanecem fiéis a Silveira a ponto de votar a favor dos interesses de última hora do prefeito.