Estou assustado. Olhando o pôr-do-sol , que é lindo — e pensando se será a última vez que verei isso.” Após a repercussão mundial da história do assassinato de John Allen Chau, de 26 anos, ojornal The Washington Post teve acesso ao diário escrito pelo missionário antes de ele ser morto por habitantes de uma tribo isolada que vivem na Ilha Sentinela do Norte, localizada no Oceano Índico entre Índia e Myanmar.
O diário, que tem 13 páginas e foi escrito com caneta e lápis, foi deixado por Chau para um dos pescadores que o transportou à ilha de modo ilegal — a região, sob administração da Índia, é protegida para preservar o modo de vida local e proteger seus membros de possíveis doenças trazidas por visitantes. De acordo com reportagem do The Washington Post, as anotações estão agora sob posse da mãe do missionário morto.
Em seu relato, Chau afirmava que queria pregar o cristianismo aos habitantes da comunidade tradicional. Para não chamar a atenção das autoridades, ele embarcou com pescadores pela noite e, após ser levado a um local próximo da ilha, percorreu o trecho final com um caiaque. Ele carregava itens como tesouras, alfinetes e peixe, que seriam presenteados aos membros da tribo. De acordo com o diário, ao entrar em contato com os habitantes, ele começou a cantar hinos de louvor, mas foi surpreendido por um jovem que atirou uma flecha em sua direção — Chau relatou que a seta atingiu sua Bíblia. “Estou assustado”, escreveu o homem em seu último registro.
Após o contato mal-sucedido, ele retornou para o barco onde estavam os pescadores. E afirmou que retonaria no dia seguinte para fazer um novo contato com os membros da tribo. Segundo testemunhas que estavam em barcos a uma distância segura, os aborígenes mantiveram contato inicial, mas ficaram irritados e começaram a atacar Chau com seus arcos e flechas. Após sua morte, ele foi enterrado na areia da praia, à beira do mar.
Em reunião na última quinta-feira (22 de novembro), a polícia indiana afirmou que não será fácil resgatar os restos mortais do norte-americano. Caso a Justiça local permita a operação, as autoridades contarão com o apoio de antropólogos, pesquisadores e especialistas em comunidades tradicionais isoladas.
Em sua conta pessoal do Instagram, o norte-americano descrevia a si mesmo como um “explorador de coração” e exibia fotos de suas diferentes aventuras ao redor do mundo. Em um dos trechos de seu diário, Chau reafirma sua obsessão em catequizar os membros da região. “Senhor, esta ilha é a última fortaleza de Satanás, onde ninguém ouviu ou teve chances de ouvir o seu nome”, escreveu.
Os habitantes da Ilha Sentinela Norte vivem de maneira isolada há pelo menos 55 mil anos: de acordo com membros de organizações que realizam o monitoramento a distância dessa comunidade, ao menos 100 pessoas vivem no local, que possui uma floresta e tem área de aproximadamente 60 quilômetros quadrados.
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Em 2004, após um terremoto que aconteceu na região do Oceano Índico, helicópteros enviados pela Índia tentaram manter uma comunicação com os habitantes em busca de oferecer assistência. Ao se aproximarem, entretanto, um dos membros atirou flechas em direção ao veículo aéreo. Em 2006, dois pescadores foram mortos após o barco onde eles estavam se aproximar demais da Ilha Sentinela Norte.
Sete pescadores que estariam envolvidos no transporte ilegal do homem foram presos pela polícia indiana. A organização Survival International, que defende os direitos das comunidades tradicionais de diferentes partes do planeta, afirmou em comunicado que a tragédia deve servir como alerta para que as autoridades indianas protejam de maneira adequada as terras dos povos que vivem na Ilha Sentinela Norte.
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