Tramita na Justiça Federal do Paraná processo sobre vazamento de ação da Lava Jato. Advogado de blogueiro diz que ‘vazamento’ é distorção acusatória.
O juiz federal Sérgio Moro afirmou que o blogueiro Carlos Eduardo Guimarães, autor do Blog da Cidadania, confirmou à Polícia Federal (PF) que avisou um assessor de Luiz Inácio Lula da Silva que o ex-presidente seria alvo de condução coercitiva.
A informação consta em um despacho publicado nesta quinta-feira (23) no processo que tramita na Justiça Federal do Paraná para investigar o possível vazamento da ação policial.
Lula foi levado para depor coercitivamente durante a 24ª fase da Lava Jato em março de 2016. Ele estava no seu apartamento em São Bernardo do Campo, na Região Metropolitana de São Paulo, e foi ouvido no Aeroporto de Congonhas. O ex-presidente responde por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
De acordo com a força-tarefa da Lava Jato, Lula recebeu como forma de propina por contratos da OAS na Petrobras um apartamento triplex no Guarujá, litoral de São Paulo, e pagamento dos custos com armazenamento de bens. O ex-presidente nega as acusações.
Eduardo Guimarães foi alvo de condução coercitiva e busca e apreensão na terça-feira (21), em São Paulo, como diligência do processo que apura o suposto vazamento. Conforme Moro, Guimarães revelou a fonte e disse ter comunicado “o assessor de Lula”.
“(…) Revelou, de pronto, ao ser indagado pela autoridade policial e sem qualquer espécie de coação, quem seria a sua fonte de informação acerca da quebra do sigilo fiscal de Luiz Inácio Lula da Silva e associados. Um verdadeiro jornalista não revelaria jamais sua fonte. Confirmou ainda que não só divulgou a informação em seu blog, mas antes comunicou-a a assessor do investigado”, relatou o juiz.
O nome do assessor não consta no despacho desta quinta.
De acordo com o juiz federal, o objetivo da investigação não era identificar a fonte da informação do blog porque esta já foi identificada. A proposta, ainda conforme Moro, o intuito é, principalmente, apurar a possível comunicação ao investigado.
A Polícia Federal afirma que a informação sobre a condução coercitiva do ex-presidente Lula partiu de uma auditora da Receita Federal que a repassou para um jornalista ligado a Eduardo Guimarães.
A Receita Federal informou à Justiça que removeu a auditora do Escritório de Pesquisa e Investigação da 9ª Região Fiscal, que fica no Paraná, para a Delegacia da Receita Federal do Brasil em Curitiba.
O que diz a defesa
O advogado Fernando Hideo, que representa o blogueiro, considera ilegais as medidas praticadas contra Carlos Eduardo Guimarães. “Sobre o tal ‘vazamento’, é uma distorção acusatória sobre a obrigação ética jornalística de verificar a procedência da informação recebida. O próprio Eduardo narra em seu blog que foi checar a veracidade das informações com o Instituto Lula”, diz trecho da nota divulgada pelo advogado.
“A Polícia Federal já tinha nomes de pessoas suspeitas e investigadas. Mas a própria busca e apreensão do notebook e celulares do Eduardo demonstra que eles estavam em busca de provas, violando o sigilo de fonte constitucionalmente assegurado.
Sobre o tal “vazamento”, é uma distorção acusatória sobre a obrigação ética jornalística de verificar a procedência da informação recebida.
O próprio Eduardo narra em seu blog que foi checar a veracidade das informações com o Instituto Lula:
“Contudo, o Blog, antes de qualquer coisa, passou a informação ao Instituto Lula, que considerou indubitável a veracidade da lista de pessoas e empresas que tiveram seu sigilo quebrado porque há informações, ali, que eram de conhecimento exclusivo da família do ex-presidente.” (http://www.blogdacidadania.com.br/2016/02/lava-jato-preve-busca-e-apreensao-em-imoveis-de-lula-e-familia/)
Portanto, se o objetivo era esse, bastava a leitura do blog. Isso demonstra sobretudo a ilegalidade das medidas praticadas contra o Eduardo.”
Críticas
A medida provocou reação da Federação Nacional dos Jornalistas e do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo. As duas entidades declararam que a Polícia Federal desrespeita o sigilo de fonte de Guimarães, garantido pela Constituição, e ataca a liberdade de imprensa e de expressão do blogueiro, num precedente que coloca em risco um dos mais importantes princípios do jornalismo: garantir o direito da população à informação.
Moro discorreu sobre o assunto. Disse que a avaliação do conteúdo do Blog da Cidadania levou à conclusão de que o blog “não seria eminentemente jornalístico”. O juiz afirmou também que a definição de jornalista e a extensão do sigilo de fonte são conceitos normativos sujeitos à interpretação do aplicador da lei, no caso o julgador.
“(…) Então o investigado Carlos Eduardo Cairo Guimarães não exerceria a profissão de jornalista, utilizando o blog somente para permitir exercício de sua própria liberdade de expressão e veicular propaganda político partidária. Embora a liberdade de expressão e as preferências partidárias devam ser respeitadas, não abrangem elas sigilo de fonte”, argumentou o juiz.
Ainda segundo Moro, na oitiva com a Polícia Federal, Guimarães qualificou-se como “representante comercial” e não como jornalista.
O juiz declarou que não é intenção dele e das demais autoridades envolvidas na investigação colocar em risco a liberdade de imprensa e o sigilo de fonte. Neste sentido, ele diz ser o caso de rever o delimitar o objeto do processo.
Ele determina que a investigação em relação às condutas de violação do sigilo funcional pelo agente público envolvido deve continuar, assim como o suposto embaraço à investigação pela comunicação da condução coercitiva. “Já que esta conduta não está, em princípio, protegida juridicamente pela liberdade de imprensa”, pontou Moro.
O nome da fonte do blogueiro deve ser mantido em sigilo, de acordo com Sérgio Moro.
Quer saber mais notícias do estado? Acesse G1 Paraná.