É inacreditável como a analise econômica brasileira se despregou totalmente da realidade econômica.
Por mais que a teoria econômica tenha se matematizado, não pode fugir dos fundamentos básicos da economia, da analise objetiva da realidade. Esses cabeças de planilha, no entanto, perderam a noção mínima sobre a relevância dos fatores que interferem na economia.
Se for analisar a economia, pode-se levantar dezenas de maneiras de “enxergar” a economia. A arte da analise econômica consiste em ter clareza sobre os fatores essenciais e ops fatores acessórios ou secundários. Por que não se enxerga? Porque a analise econômica brasileira se subordinou totalmente aos interesses de mercado. Se qualquer diagnóstico bate na palavra juros, imediatamente o economista muda de tema, tergiversa ou busca algum fator secundário para fugir do busílis da questão.
A economia é movida pelos seguintes motores:
• Consumo das famílias
• Investimento privado
• Investimento público
• Investimento externo.
Os cabeções da equipe econômica – que o marketing tratou de “dream team” – definiram que a recuperação viria pelo investimento privado. Era evidente, desde o início, que não viria, como cansamos de apontar aqui.
O investimento privado só ocorre nas seguintes circunstâncias:
Fator central – quando há demanda não atendida pela capacidade instalada da economia.
Fatores secundários – acesso a financiamento, estabilidade de preços, confiança na política econômica.
Simples assim. Sem demanda, não há investimento. Com demanda, haverá mais ou menos investimento dependendo dos fatores secundários.
Os cabeções definiram que o investimento voltaria quando se alcançasse o equilíbrio fiscal via corte de despesas. Côrtes draconianos, do período Joaquim Levy, foram mantidos e agravados pela PEC do Teto.
O governo matou a demanda pública, com a PEC do Teto e a continuidade do desastre Joaquim Levy. Era de uma obviedade assustadora que era um caminho errado:
1. A recessão comia solta.
2. Recessão significa queda de demanda.
3. Queda de demanda significa aumento da capacidade ociosa das fábricas.
4. Aumento da capacidade ociosa das fábricas significa investimento paralisado, por desnecessário.
Um ano depois, com a recessão se tornando depressão, o presidente do Banco Central Ilan Goldjan – a quem dediquei anos atrás a expressão cabeça de planilha – dá uma entrevista à Folha de São Paulo em que admite:
Há um ano, todos imaginavam que a economia brasileira poderia voltar a crescer a partir do aumento de confiança, que geraria investimentos, renda e consumo. O emprego seria o último a se recuperar.
É inacreditável! Um erro de diagnóstico que acaba de arrebentar com a economia brasileira, arrebentando com as contas públicas, com o emprego, afetando programas sociais, levando de volta para a fome milhões de pessoas. E Ilan trata como se fosse um mero erro de avaliação, que pode ser facilmente corrigido.
E continua com seu diagnóstico:
Essa ordem está um pouco diferente. A inflação caiu mais rápido do que se imaginava. Inflação baixa gera aumento de salário real, que gera consumo, e a economia começa a se recuperar. Essa é uma hipótese. A outra é [a liberação das contas inativas do] FGTS, que pode ter dado um alento.
O que define a massa salarial é o nível de emprego. A política monetária impõe o custo de 16 milhões de desempregados. Mas Ilan diz que a economia vai melhorar porque os que conseguiram manter o emprego não terão os salários afetados pela inflação.
Olhe a maluquice:
1. A massa salarial é de 100.
2. Ai o desemprego afeta 16. O número de empregados cai para 84.
3. Com o desemprego rondando, aumentará a rotatividade do emprego, reduzindo o salário nominal.
4. Com a rotatividade, os empregados adotarão toda a cautela em relação ao consumo, para se precaverem contra a possibilidade de desemprego.
Aí os repórteres fazem a pergunta óbvia:
Por que a volta da confiança não trouxe investimentos?
Para bater no investimento, a confiança tem que passar o obstáculo da capacidade ociosa, que ainda é muito grande. O investimento, em geral, é para aumentar a capacidade. Existem alguns setores, infraestrutura, que poderiam ter aumento de investimento.
Evidente! Levou um ano em que se queimou riqueza, bem-estar, em que se jogaram milhões de pessoas de volta para a linha da pobreza, para Ilan completar seu aprendizado do óbvio.
Mas defende a fada das expectativas:
A confiança não gerou esse aumento de atividade no ano passado. Mas também não reduziu a atividade, mesmo com a incerteza recente [após a delação dos donos da JBS].
Ou seja, a atividade cai 8%, gera uma enorme capacidade ociosa. Uma política econômica minimamente competente lograria recuperar rapidamente a demanda, porque já existe uma capacidade ociosa instalada na economia. E Ilan comemora o fato da atividade econômica não ter caído mais ainda.
Quando entra no tema juros, aí fica tudo nas mãos de Deus.
Por que, apesar da redução da taxa básica de juros, as taxas cobradas de empresas e consumidores caem tão devagar?
A tendência é de queda. Com a economia se recuperando e as incertezas diminuindo, o custo de crédito tende a diminuir. Leva um tempo.
E aí entra na questão do endividamento da economia, ponto que deveria ter sido tratado de saída, para destrancar os negócios:
No entanto, o que diz o gênio da planilha:
Temos que trabalhar para ter uma dívida sustentável. Isso exige a reforma da Previdência e ações para conter despesas obrigatórias, a grande causa dos impactos fiscais.
Esse é o custo do subdesenvolvimento e de uma elite que aprendeu a viver de rendas.