Com nova igreja definida, padre vítima de racismo só espera ‘ser acolhido’
06/12/2014 15h53 – Atualizado em 06/12/2014 17h26
Com nova igreja definida, padre vítima de racismo só espera ‘ser acolhido’
Grupo de moradores pediu sua saída de paróquia em Adamantina.
Pároco deve assumir santuário em Dracena, conforme decisão da Diocese.
Apesar da mobilização pela sua permanência na Paróquia Santo Antônio, em Adamantina, o padre Wilson Luís Ramos deve ser transferido nos próximos dias para o Santuário Nossa Senhora de Fátima, em Dracena. O anúncio foi feito no final da tarde desta sexta-feira (5), por meio de circular enviada pela Diocese de Marília, segundo o pároco. “Só espero ser bem acolhido”, diz o sacerdote, que foi vítima de racismo durante o período de um ano e meio que ficou na paróquia atual, em entrevista ao G1.
Ramos explica que a data exata da mudança não está definida, porém já está com as malas prontas. “Comecei a me preparar assim que foi anunciada minha transferência para outra cidade. Só quero que esta minha passagem por Dracena seja mais tranquila. Em meus vários anos como padre, foi a primeira vez que tive problemas com a população”, conta.
O padre, de 50 anos, estava em Adamantina há um ano e dez meses. Sua saída da igreja atual foi definida no dia 28 de novembro. Em nota, o bispo Luiz Antônio Cipolini, responsável pela paróquia, informou ter encontrado uma “paróquia dividida, com grave prejuízo ou perturbação à comunidade eclesial. “Não consigo enxergar, nesta situação, nem vencedores e nem vencidos, apenas pessoas que amam a Jesus Cristo e à sua Igreja e querem trabalhar pelo crescimento do Reino de Deus”, aponta o pronunciamento oficial.
Entretanto, Ramos explica que um grupo de pessoas realizou reclamações à Cúria, com o objetivo de retirá-lo da cidade. “Eu acho que o bispo deve ter ouvido estas queixas. Eu vou respeitar esta ordem. Não foi minha vontade, mas respeito a decisão”, explica.
presenciar atitude racista por parte dos fiéis
(Foto: Wilson Luís Ramos/Arquivo pessoal)
O pároco relata que viveu situações de racismo desde sua chegada em Adamantina, porém as “brincadeiras” nunca causaram abalo durante suas celebrações. “Já falaram que deveriam trocar o galo de bronze, que fica em cima da igreja, por um urubu. Muita gente conversa comigo e diz que fazem piadas sobre mim, porém isso nunca afetou a minha vida”, aponta.
As críticas ao padre não representam o que grande parte dos moradores da cidade, que tem pouco mais de 33 mil habitantes e está localizada no Oeste Paulista, defende. Um abaixo-assinado, que já colheu aproximadamente 7 mil assinaturas, pede a permanência do religioso no município. Segundo o organizador do movimento, o jornalista Danilo Alves, “o padre Wilson tem que continuar”.
“Estamos organizando um ato em frente à igreja durante as missas pedindo a permanência dele e vamos fazer faixas contra o racismo. Nunca presenciei o ato, mas já ouvimos comentários de que existe uma parcela de fiéis que não aceitam o padre por causa da cor. Eles fazem comentários e brincadeiras maldosas”, esclarece o idealizador.
Os apoiadores de Ramos se instalaram em frente a algumas lojas do comércio de Adamantina para recolherem as assinaturas. Além disso, o movimento “Fica, Padre Wilson” se organiza por meio das redes sociais. Só em uma das páginas de apoio ao pároco, existem quase 2 mil participantes.
Wilson Luís Ramos nasceu na capital paulista, mas morou desde criança em Tupã (SP), no interior do Estado. Nesta última cidade se tornou padre e celebrou missas em diversas igrejas. “A religião esteve presente na minha vida desde pequeno. Desde jovem, já tinha em mente a decisão de ser padre”, conta.
Filho de um pedreiro e de uma empregada doméstica, o sacerdote afirma que já tinha sofrido ofensas quando pequeno, porém não esperava esse comportamento por parte dos fiéis. “Minha família me passou valores que eu levo para a minha vida toda, além de ter me iniciado na igreja. Mesmo quando pequeno, não me abalei com a situação. Mas sei que existem aqueles que não aceitam pessoas negras”.
O G1 tentou entrar em contato com a Cúria Diocesana de Marília, porém não obteve sucesso. Por telefone, a equipe de reportagem ligou para o bispo Luiz Antonio Cipolini, porém foi informada de que ele “tinha muitos compromissos e que dificilmente iria falar com alguém neste sábado”.
Segundo Ramos, só um “milagre” poderia impedir que ele vá para Dracena. “Eles não são impossíveis. Eu só peço que as pessoas não discriminem o próximo e passem uma mensagem de paz uns aos outros. Espero que na nova igreja tenha uma recepção mais tranquila. Eu agradeço toda a população e peço desculpas se incomodei alguém”, finaliza.
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