Ciro Marques
Repórter de Política
A declaração do vice-governador eleito, Fábio Dantas (PC do B), sobre a necessidade do Governo do Estado arrecadar R$ 1 bilhão a mais em 2015 para pagar o funcionalismo público em dia, exibiu a grave situação das contas públicas do Rio Grande do Norte. E, diante disso, para o procurador-geral de Justiça, Rinaldo Reis, não restam dúvidas que a próxima gestão precisará tomar medidas enérgicas e impopulares sobre a folha de pagamento. Para Reis, toda a população espera que ações nesse sentido sejam feitas, para que o Estado possa diminuir a máquina e recuperar a capacidade de investimento do Estado.
A declaração de Rinaldo Reis, no entanto, foi dada com certo ressentimento. Líder do Ministério Público do RN, o procurador-geral de Justiça não quer parecer um “intrometido” no Executivo Estadual. “Não quero falar o que o futuro governador (Robinson Faria, do PSD) precisa ou não fazer, mas é lógico que essa situação da folha de pagamento tem que ser urgentemente enfrentada. Acredito que é isso que a gente espera, é isso que a população espera”, afirmou Reis em contato com O Jornal de Hoje.
Segundo o procurador-geral de Justiça, para enfrentar essa situação, inclusive, o futuro governador “precisará tomar medidas enérgicas e, talvez, amargas sobre a folha, como forma de deixar a máquina pública estadual mais eficiente”. “Diante dessa situação exposta pelo vice-governador, que é o coordenador da equipe de transição, não restam dúvidas da necessidade de ações nesse sentido”, acrescentou o procurador.
Receoso, Rinaldo Reis, obviamente, preferiu não entrar em detalhes, dizendo que medidas poderiam ser essas. Contudo, é possível ter uma ideia a que o procurador-geral de Justiça se referiu ao falar em “ações amargas”. Afinal, no ano passado, diante do atraso no pagamento da folha salarial do Executivo (que continua até hoje), o Ministério Público abriu investigação para apurar se as medidas legais, com vistas a reduzir despesas públicas e evitar o atraso, haviam sido tomadas antes da ação extrema de adiar o pagamento.
“A não adoção, pelo Governo do Estado, de quaisquer das medidas constitucionalmente previstas para a diminuição de despesa com pessoal em razão da anunciada crise financeira, tais como redução em pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança (CF, art. 169, § 3º, I) e exoneração de servidores não estáveis (CF, art. 169, § 3º, II), bem como de outras providências previstas na Lei Complementar Federal n° 101/2000, como extinção de cargos e funções (art. 23, § 1º), ou ainda extinção de órgãos públicos”, justificou, na época, o procurador-geral de Justiça Adjunto, Jovino Pereira, ao abrir o inquérito para investigar as contas públicas da gestão Rosalba Ciarlini (DEM).
DUODÉCIMO
Naquela época, ao abrir o inquérito para apurar a crise financeira do Governo do Estado, o Ministério Público tinha uma “motivação” que ia além da necessidade de resolver um aparente problema do Estado: o corte no pagamento do duodécimo. Isso porque, mesmo diante de crescentes recordes de arrecadação, o Governo alegou que passava por uma grave crise financeira para não realizar o repasse integral de recursos financeiros aos poderes e órgãos auxiliares.
E apesar de ter começado no ano passado, os cortes continuam até hoje. Para se ter uma ideia, em outubro, o Governo do Estado atrasou o repasse do já reduzido duodécimo do MP e impediu que o órgão pagasse, na data que sempre paga, no dia 25, os seus servidores. A situação foi tão grave que o MP precisou recorrer mais uma vez a Justiça para viabilizar o repasse.
Bom, pelo menos essa dor de cabeça o governador eleito, Robinson prometeu não dar ao Ministério Público – nem ao Tribunal de Justiça, Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas do Estado (TCE). Em reunião realizada nessa semana, com o procurador-geral de Justiça, o futuro chefe do Executivo prometeu que vai cumprir a risca o que for estabelecido na Lei Orçamentária Anual (LOA).
“Posso dizer que Robinson nos tranquilizou ao prometer que cumprirá o que a lei orçamentária fixar. Isso não deveria ser nem algo tão importante, pois lei tem que se cumprir, mas diante da situação atual, é sim algo de se destacar”, comentou Rinaldo Reis.
MP ajudará a aumentar arrecadação do Governo
É claro que o encontro do governador eleito, Robinson Faria (PSD), com o procurador-geral de Justiça, Rinaldo Reis, não teve apenas o objetivo de tranquilizar o MP a respeito do pagamento do duodécimo no próximo governo. Robinson e Rinaldo também combinaram, ainda em caráter informal (porque o pessedista só se torna oficialmente governador em janeiro), um acordo que ajudará a aumentar a arrecadação estadual e, ainda, reduzir gastos públicos – diminuindo a possibilidade de desvios ou pagamentos irregulares. “Será algo parecido com o que já ocorre em Minas Gerais, onde MP e Governo são forte aliados”, comentou Rinaldo Reis.
O aumento da arrecadação se dará por meio de uma ação mais forte do MP no combate a sonegação fiscal e na recuperação de ativos do governo, “dentro daquilo que possamos contribuir”, ressaltou Rinaldo Reis. O objetivo é criar uma troca de informações mais eficiente entre Secretaria de Tributação e Ministério Público, como forma de ajudar o MP a identificar empresas que não estão pagando regularmente seus impostos ou que demonstrem indícios de outros crimes tributários.
Combatendo isso de forma mais efetiva, com a ajuda de informações do próprio governo, o Ministério Público acaba por promover um aumento na arrecadação estadual e, consequentemente, fazer o Estado ter mais dinheiro para investir e pagar seus servidores. “Poderemos, nos casos que for necessário, propor ações para viabilizar esse pagamento e permitir que o Estado aumente a sua arrecadação”, afirmou Rinaldo Reis.
Se vai permitir que o Estado tenha mais recursos para gastar, o MP também quer aumentar a regularidade desses gastos e, para isso, conseguiu do futuro governador a promessa de que irá, sempre que possível, ouvir os promotores. “Hoje, o gestor espera que haja uma decisão judicial para que um pagamento seja, por exemplo, suspenso e é isso que queremos evitar”, explicou Rinaldo Reis.
Ouvindo os promotores, a futura gestão poderá suspender o pagamento de um contrato, por exemplo, quando houver indícios de irregularidade encontrados pelo MP. Isso permitirá que gastos suspeitos ou superfaturados sejam feitos. Diminuirá, também, a necessidade de ações judiciais e de recuperação do dinheiro perdido.
O MP e o Governo poderão evitar, por exemplo, o que aconteceu com o Hospital da Mulher, em Mossoró. Lá, o Ministério Público apontou uma série de irregularidades na forma como a Associação Marca foi contratada para gerir a unidade médica e pediu a suspensão do contrato. O Governo Rosalba Ciarlini decidiu continuar com a parceria, o MP propôs a ação civil pública por improbidade administrativa e, por fim, a Justiça determinou a suspensão do contrato.
O caso, no entanto, acabou ensejando outras ações civis públicas, porque o Governo do Estado manteve a fórmula de contrato e acertou com outra organização social também de forma irregular, novamente sem ouvir os promotores do Patrimônio Público. Resultado: o MP acabou propondo uma nova ação, acusando até a governadora Rosalba Ciarlini de improbidade administrativa e apontando um desvio de mais de R$ 11 milhões, pagos de forma irregular durante esse período. Se o Executivo tivesse ouvido os promotores do MP, esse recurso jamais teria saído dos cofres públicos.