Sugerido por Martim Assueros
Por Rafael Babosa
“Educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo”. A máxima do educador e filósofo Paulo Freire remete à mudança social que cada um de nós pode promover a partir do conhecimento. A família da dona de casa Aila Adriana deu um largo passo para a transformação de sua realidade através da formação profissional e começou a nova fase com um ato de cidadania.
Aila, o marido Josiel e o pequeno Adrian Michel, filho de 9 anos de idade do casal, viviam desde 2009 com o auxílio de bolsas do Governo Federal e ajuda financeira de parentes. Estudante de medicina, Josiel de Medeiros recebia uma bolsa inferior a um salário mínimo de um programa de extensão da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), e era o responsável por arcar com a maior parte das despesas da casa.
Aila era cadastrada no programa Bolsa Família, de onde recebia mais R$ 35 para dar suporte aos estudos do filho. Entretanto, no segundo semestre deste ano ela foi até a Secretaria Municipal de Assistência Social para se descadastrar do programa.
Josiel formou-se, está trabalhando no Programa de Saúde da Família (PSF) do município de Tangará e em mais duas cidades (Extremoz e Monte Alegre), cumprindo regime de plantão remunerado pelas prefeituras. A família Medeiros não precisa mais do benefício. “Sou grata ao tempo que recebi, ajudou muito. Mas tem mais gente precisando”, justificou a dona de casa de 27 anos de idade.
Naturais do interior do Rio Grande do Norte, Aila, Josiel e Adrian chegaram à capital em 2009 com expectativas sobre a nova carreira que o pai iria iniciar ainda na UFRN. Sem muitas condições financeiras para custear a estadia, os três foram morar na comunidade da Toca da Raposa, em Nova Parnamirim.
Apertando daqui e dali, aos poucos a família foi se segurando para que não faltasse nada dentro de casa. Aila lembra que a morada antiga era menor e mais modesta que a atual. Desde julho passado eles se mudaram para outra residência, mais ampla e mais confortável, em uma rua pavimentada. A realidade dos caminhos de barro ficou para trás e a família Medeiros agora galga novos degraus para ascender socialmente.
Se dividindo entre os três empregos, Josiel consegue dar conta de pagar todas as contas, enquanto Aila toma conta da casa. Adrian Michael, que até o início de 2015 cursava o 4º ano da Escola Municipal Luiz Calos Guimarães, já foi matriculado numa instituição de ensino privada, com melhores condições de estudo.
A intenção dos pais é propiciar a ele uma melhor formação, para que Adrian possa também ganhar seu espaço de maneira digna na sociedade.
Quando o NOVO esteve na nova casa da família, que ainda é alugada, Josiel havia saído para trabalhar no PSF da cidade de Tangará. Sem abandonar a simplicidade de quem carrega na bagagem uma dura história de dificuldades, Aila pediu para não ser fotografada pela reportagem.
Daqui para frente, a família quer se estruturar financeiramente, para ter mais conforto e qualidade de vida, sem esquecer por onde passou. “Hoje a gente já consegue ajudar quem nos ajudou e cada dia mais vai melhorando as coisas”.
Josiel largou emprego no banco para estudar medicina
Josiel e Aila se conheceram na cidade de Severiano Melo, há 356 km de Natal, onde ela nasceu. A jovem conta que o pai do marido é pastor de uma igreja evangélica e que, apesar de ser da vizinha Patu, passou a morar em Severiano Melo para trabalhar em uma igreja.
Era 2005 quando os dois se casaram. Ela tinha 16 e ele 18. Foram morar na casa do sogro de Aila e abriram um comércio na cidade. Um ano depois Josiel ganhou bolsa do Programa Universidade para Todos (Prouni) e partiu para estudar na capital. Voltava para casa apenas durante os finais de semana.
Pouco tempo depois, Aila lembra, o marido desistiu do curso. Foi quando descobriu que queria ser médico. Para dedicar-se ao sonho Josiel de Medeiros conseguiu uma bolsa em um cursinho particular de Natal. “Ele vinha em casa de 15 em 15 dias”, recorda Aila Adriana, que neste período já havia se mudado para Patu.
Neste meio tempo, Josiel passou no concurso do Banco do Brasil. A família precisou se mudar para o Maranhão, onde viveu por seis meses. Com Adrian já nascido, à época com um ano de idade, o casal conseguiu transferência ao alegar que a criança não conseguia se adaptar à cidade.
Seis meses após ser empossado, Josiel de Medeiros conseguiu voltar para o Rio Grande do Norte, passando a trabalhar na agência bancária da cidade de Alexandria. No retorno, o patuense voltou a se dedicar aos estudos, para ingressar na Universidade Federal. A custo de muita dedicação relatada pela esposa, ele conseguiu o feito dois anos depois, em 2009. Foi aí que os três se mudaram para Natal.
Contudo, foi preciso fazer uma difícil escolha: abdicar da carreira estável no banco para se dedicar às atividades acadêmicas. O casal não hesitou, foi em busca do sonho de Josiel, e hoje a família inteira já consegue respirar aliviada com o que o médico consegue proporcionar. “Já tivemos muitas melhorias da vida de antes para cá, e estamos caminhando para melhorar mais. Deus sempre nos acompanhou”, pontuou Aila.
Atitude gerou repercussão na Secretaria de Assistência Social
Em uma organização social na qual as pessoas estão acostumadas a levar vantagem e se beneficiar através de ganhos indevidos, a honestidade chega a ser uma virtude que causa estranheza. Foi o que ocorreu com Aila Adriana, quando ela foi pedir para se desvincular do Bolsa Família. A atitude da dona de casa surpreendeu os servidores da Secretaria de Assistência Social de Parnamirim, por não ser comum a muitos beneficiados.
De acordo com a secretária Mara Noga, a maior parte da população que recebe o auxílio aguarda até que seja solicitado um recadastramento, para informar que não precisa mais do dinheiro dado pelo governo federal. Desta maneira, quem está na fila de espera para passar a receber a ajuda de custo acaba pagando, demorando mais a entrar na lista dos beneficiados.
“Eu achei interessante que me botaram numa sala com os coordenadores, e eu sem entender o motivo daquela situação. Mas era para incentivar a outras pessoas a fazer isso”, recorda Aila Adriana.
Para ela, é importante a consciência, para que a garantia de continuidade do projeto seja resguardada. “A gente sabe que tem muita gente que não precisa mais do programa e não vai lá admitir isso. O tempo que eu precisei recebi. Depois que não precisei, fui lá me descadastrar porque tem muitas pessoas que precisam. Se todos fizessem assim, seriam mais vidas melhoradas”, opinou.
De acordo com as normas que regem o programa federal, seu direcionamento é para as famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país, de modo que consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza.
As familias extremamente pobres são aquelas que têm renda mensal de até R$ 77,00 por pessoa. As famílias pobres são aquelas que têm renda mensal entre R$ 77,01 e R$ 154,00 por pessoa. As famílias pobres participam do programa, desde que tenham em sua composição gestantes e crianças ou adolescentes entre 0 e 17 anos.
Ao deixarem de se enquadrar neste perfil, as famílias devem comunicar aos órgãos que respondem pelo seu cadastramento para que sejam retiradas do programa.