do Justificando
Ministério Público Transformador abre uma fresta para entrada de ar em um ambiente sufocante
por Roberto Tardelli
Vamos aplaudir o Coletivo MP TRANSFORMADOR, vamos dar boas vindas a esses promotores do Brasil que não se conformam com o raciocínio monolítico e empobrecido que dominou o Ministério Público (MP) brasileiro, com exceções no MPT. O monotemático MP se perdeu por completo e teve seu apogeu na propositura e defesa religiosa desse delírio processual das desmedidas contra a corrupção, que instauraria um estado fascista ente nós e tornaria oficialmente o MP na versão tropicalista da GESTÃO.
Tornou-se um MP, não apenas acusador, mas completamente obcecado pela condenação, agravando aos níveis de desespero a tragédia penitenciaria brasileira. Um MP tão perdido que, muito além de apoiar a invasão policial das escolas ocupadas (não invadidas, quem invadiu as escolas foi a Polícia; os alunos, sim, nada mais faziam que ocupá-las), se deram a ofender estudantes, algemar estudantes, a processar os pais dos estudantes por não os impedir de ir à escola. Um MP que foi se tornando a extensão da viatura da polícia militar, um MP que, ao assumir protagonismo de investigações seletivas, deixou de lado o compromisso com a legalidade. Um MP que fez da delação premiada um festival absolutamente midiático de destruição de pessoas e de reputações. A delação não mais é um meio de investigação, mas um meio de extorsão, de chantagem, de canalhice processual. A delação fez com que promotores e juízes criassem simbioses clandestinas e invisíveis, destruindo a dialética processual.
Esse Coletivo é como alguém que consegue abrir uma fresta para entrada de ar em um ambiente sufocante. Ao vento fresco da liberdade, vem também o medo da liberdade, o medo de ser livre. A Grande Baleia Institucional tem um ventre acolhedor, todos se tornam irmanados e corporativamente incompreendidos. A Grande Baleia Institucional exige lealdade e fidelidade caninas de seus habitantes e devolve com salários e penduricalhos, carros oficiais e insígnias, elevadores privativos e vestes talares, aos que correspondem à expectativa do não-pensamento, aos que rejeitam furiosos a possibilidade de serem livres e autônomos e constitucionalistas. Aliás, essa uma, a Constituição passou a ser a inimiga a ser combatida ou o monstro disforme a ser domado. Quem a defende, decerto está vinculado aos piores interesses. A Constituição nos fará o paraíso dos comunistas, ateus e corruptos.
A Grande Baleia Institucional fez com que jovens promotores pensassem como velhos burocratas. A lei e a ordem, a ordem ser mantida a qualquer preço acabou por implicar a prisão de crianças, a invasão das escolas por policiais armados, algo que sequer a ditadura militar cogitou em fazer; juntamente aos coturnos da polícia, os ternos bem cortados dos promotores, compuseram os cenários das escolas nessas últimas semanas. Imaginei ingenuamente que a foto de um dessas centenas de confrontos fossem despertar o MP desse sonho letárgico e autoritário. Errei completamente.
Boas vindas aos Coletivos de Transformação!
Vida longa aos promotores e procuradores que o compõem. De minha parte, publicamente, me ofereço a defendê-los, com o mesmo amor que devotam à Grande Baleia Institucional que agora os amaldiçoa, caso venham a ser perseguidos pelas posições libertárias que defendem.
Conclamo todos os advogados comprometidos com o processo democrático que o façam, que o façamos, porque esse pessoal vai levar chumbo grosso. Defendê-los é exercer a cidadania no que ela tem de mais revigorante: defender a liberdade.
Viva o Coletivo!
Roberto Tardelli é Advogado Sócio da Banca Tardelli, Giacon e Conway. Procurador de Justiça do MPSP Aposentado.