SÃO GONÇALO DO AMARANTE RN-Seis meses após decisão do STF, 74 mulheres gestantes ou com filhos de até 12 anos continuam presas no RN


ércia Freitas de Lima se preparava para dar a luz a mais um filho, aos 32 anos, e precisou ser levada às pressas para a maternidade. Era o sexto rebento. Seria uma história comum, se ela não estive presa no Complexo Penal João Chaves, em Natal. Gércia de Lima é uma das 74 presas provisórias do Rio Grande do Norte que teriam direito de cumprir a pena em prisão domiciliar, porém, continuam na cadeia.

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em fevereiro conceder prisão domiciliar a presas suspeitas de crimes sem violência ou grave ameaça, sem condenação, que estejam gestantes ou que forem mães de filhos com até 12 anos. Mais de seis meses após a determinação, as internas beneficiadas ainda têm dificuldade de conseguir efetivar o direito.

O bebê nasceu e Gércia de Lima voltou junto com ele para a carceragem. O parto aconteceu em abril. Dias depois, a interna teve complicações de saúde. Os pontos da cirurgia abriram e infeccionaram. Mais uma vez teve que ser levada para o hospital. Somente no início deste mês de julho voltou para o presídio, após alta médica.

Ela está presa por furto. A Constituição Federal não prevê prisão preventiva para esse tipo de crime, no entanto, como Gércia é reincidente, acabou ficando detida, aguardando a sentença. A Defensoria Pública entrou com um habeas corpus, embasado na decisão de fevereiro do STF, mas o pedido foi negado por causa da reincidência.

De acordo com a Defensoria Pública do Estado, 74 mulheres estão em situação semelhante, do total de 171 presas provisórias do RN. São 53 no CDP de Parnamirim, mais três na ala feminina do Complexo Penal João Chaves, em Natal, onde está Gércia, e 18 em Mossoró.

O defensor Rodrigo Lira afirma que, mesmo após a determinação do Supremo Tribunal Federal, nada mudou. “Não se cumpriu o habeas corpus coletivo como o Supremo determinou. E isso não é só no Rio Grande do Norte, em outros estados também”. Lira coordenava até o início de julho o Núcleo Especializado de Assistência aos Presos Provisórios da Defensoria, e acompanhou os procedimentos desde o início.

Depois que o STF proferiu a decisão, os defensores públicos começaram a agir com o objetivo de converter as prisões. “A gente achou que, com a decisão do Supremo, isso seria mais fácil, mais acelerado. Mas não, continuou esbarrando nas mesmas dificuldades anteriores”, diz Rodrigo Lira.

Foram poucas as internas que conseguiram deixar a cadeira, e a dificuldade maior é com o Poder Judiciário. De acordo com o que conta Rodrigo Lira, os magistrados potiguares não têm levado em consideração a determinação do STF quando vão decidir sobre os pedidos dos defensores.

“Os juízes não seguem essas premissas que foram balizadas pela decisão do Supremo. Eles estão avaliando caso a caso, e a decisão diz que são todas as presas que se enquadrem nas condições que foram descritas no texto”.

Mudança de estratégia

A Defensoria Pública vinha realizando os pedidos de conversão das prisões para domiciliar de forma individual, sempre que identificava mulheres que se encaixavam nas condições do STF. Contudo, como não tem dado certo, o órgão decidiu mudar a estratégia.

Rodrigo Lira adianta que os defensores estão fazendo o levantamento sobre as presas provisórias, bem como dos documentos delas, que comprovam o direito, para ajuizar uma medida coletiva. “Seja um habeas corpus no próprio Tribunal de Justiça, com base na decisão do Supremo Tribunal Federal, ou uma reclamação constitucional no próprio STF”.

A reclamação constitucional é uma medida utilizada quando há um descumprimento de uma determinação do STF. Neste caso em específico, deve informar que a Justiça local não cumpriu a nova norma, solicitando que o Supremo tome providências.

Tribunal de Justiça

Em nota, a assessoria do Tribunal de Justiça informou que as decisões dos magistrados não são monitoradas porque eles têm liberdade para decidir de acordo com cada caso. “A própria decisão do STF observou que os juízes poderiam deixar de conceder o HC, desde que de forma motivada”, afirma a assessoria do Tribunal.

No entanto, de acordo com a assessoria do TJ, Fábio Ataíde, juiz auxiliar da Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, responsável por acompanhar o sistema prisional, vem monitorando “de perto” a situação das presas e esse acompanhamento resultou em um provimento da Corregedoria sobre diretrizes políticas para atenção à mulher no Sistema de Justiça Penal.

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