A PALAVRA DO DIA-a obra expiatória de Cristo no Calvário.


Estudo devocional e teológico em Isaías 53

Isaías 53 é um dos textos mais impactantes das Escrituras Sagradas. Nele encontramos alento para a alma, devoção para o espírito e esperança para tempos conturbados.

Escrito entre 740 e 680 a.C o livro de Isaías é considerado um dos principais livros do Antigo Testamento. Devido sua ênfase nas profecias acerca do Messias, Isaías é referido como o profeta messiânico, o profeta da redenção e até mesmo o profeta evangélico.

Isaías 53, portanto, é a síntese da sua mensagem profética. Ele fala sobre a aparição, as dores e a glória do Messias que havia de vir.  Segundo o Comentário Beacon, “esta é a mais importante entre as profecias messiânicas do Antigo Testamento. Quem, além de Isaías, poderia ter escrito um milagre literário dessa magnitude? E quem, além do Espírito Santo, poderia ter inspirado seus detalhes? Policarpo chamou-a de passagem dourada do Antigo Testamento”.

Diante de sua beleza, os versos soam-nos como um belo cântico, o Cântico do Servo, que explicita de maneira inquestionável a obra expiatória de Cristo no Calvário. Lawrence Richards escreve que “lendo essas palavras antigas podemos apenas inclinar as nossas cabeças e adorar. Elas nos introduzem à própria presença do nosso Deus”[i].

Apesar de posições contrárias, advindas principalmente do judaísmo, não há como não vincular essa passagem à vida do meigo Nazareno, o Verbo encarnado que habitou entre nós (Jo 1.14). O próprio Jesus aplicou esta profecia a si mesmo (Lc 22.37), assim como o fizeram seus discípulos (Mt 8.17; Jo 12.38; Hb 9.28), reconhecendo que ela havia se cumprido na vida do Mestre. Portanto, “a harmonia entre a vida e a morte de Jesus Cristo é tão precisa, que não poderia ser resultado de uma conjectura ou acidente”.

Para além da hermenêutica, o senso comum reconhece nos versos de Isaías 53 as marcas do Galileu. Após uma pesquisa aplicada nos Estados Unidos em que esse texto era lido do início ao fim, sem fazer menção ao nome de Jesus, a grande maioria das pessoas respondia, ao final, que o texto se referia a ele. Para comprovar, faça esse mesmo teste com outras pessoas.

Devido sua riqueza literária e profundida teológica, várias abordagens poderiam ser dadas ao relato de Isaías 53, especialmente do ponto de vista doutrinário, visto que contém a suma do fundamento teológico da redenção que se consumou na cruz do calvário. Todavia, há também muita devoção nesse texto. Ele está encharcado de espiritualidade, piedade e de esperança.

Assim, Isaías 53 é, além de tudo, uma mensagem de esperança, mormente para tempos de descrença e desespero.

Em termos bíblicos, porém, devoção não se confunde com mensagem de auto-ajuda. Definitivamente, o encorajamento e a esperança que se extrai do texto Sagrado apontam para o fortalecimento da fé (Ef 6.10), o conforto espiritual (Rm 1.11) e para a verdadeira alegria (1 Ts 5.16), em Cristo.

A esperança cristã se fundamenta na fé em Deus, se fortalece na experiência e aponta para o amor (Rm 5.4). Enquanto isso a auto-ajuda se estriba na confiança e na capacidade pessoal.

A esperança cristã é cristocêntrica. A secular é antropocêntrica.

ESPERANÇA EM TEMPOS DE DESCRENÇA

 A mensagem completa de Isaías 53 tem início no verso 13 do capítulo anterior, até o verso 15, apresentando o Servo do Senhor. Na sequência, no verso primeiro encontramos duas perguntas: “Quem deu crédito à nossa pregação? E a quem se manifestou o braço do Senhor?

Tais indagações evidenciam a descrença dos tempos do profeta. Quem poderia acreditar em um Messias sofredor? Quem acreditaria que o enviado de Deus haveria de ser desprezado e exposto ao vitupério?

A descrença é um estado de negação a Deus e ao seu poder. Há uma grande diferença entre ter dúvida e ser incrédulo. A dúvida é inerente à condição humana, dadas as nossas limitações. A incredulidade é a atitude de rejeição à manifestação divina. Jesus bradou contra os incrédulos (Mt 17.17), mas não negou o pedido de prova de sua ressurreição para dissipar a dúvida de Tomé (Jo 20.27). A dúvida não é um problema até ela se converter em incredulidade. E isso acontece quando elas não são resolvidas – ou são mal resolvidas.

Vivemos, igualmente, tempos de descrença. Não de descrença na religião (e nas igrejas), que floresce cada dia mais e ressurge inclusive na esfera pública. Presenciamos, por outro lado, a descrença no Deus das Escrituras: pessoal, soberano e que se interessa pelo ser humano.   Uma descrença prática que, a despeito de ser afirmar crer em Deus, não acredita que ele seja capaz de “manifestar o seu braço”, intervir na história e efetuar milagres em nossos dias. Eis a razão pela qual notamos um sem número de ateus práticos em nossas igrejas: creem com os lábios, mas descreem com o coração.

Ao menos do ponto de vista da experiência com o sagrado, a descrença religiosa e o ateísmo cristão talvez sejam mais perigosos que o ateísmo secularista, na medida em que, diante do conformismo e do tradicionalismo da religiosidade formal, impossibilitam a plena experiência com Deus e impedem, ao mesmo tempo, o retorno imediato à verdadeira espiritualidade. Mais cedo ou mais é possível que o ateu reconheça a falibilidade de seus argumentos e de sua cosmovisão com um todo, sentindo a necessidade de voltar-se para Deus. Enquanto isso, aqueles que vivem nas águas gélidas da religião da descrença, apegados ao formalismo e vinculados a uma divindade distante; um Deus sem poder, dificilmente cairão em si e abandonarão a vida de pseudo-credulidade que estão acostumados.

Com o passar do tempo a rotina da falsa credulidade retira o discernimento e a capacidade de vislumbrar o toque de Deus nas pequenas coisas da vida. E assim, o crente incrédulo torna-se incapaz de ver e reconhecer sua própria incredulidade. No fim das contas, a falsa espiritualidade é a pior das cegueiras. É a cegueira daquele que têm olhos, mas não vê (Is 43.8).

Não é sem razão que Jesus bradou contra os falsos crentes da sua época, principalmente os fariseus. Acostumados ao ritualismo e ao rigor legalista, esqueceram-se de Deus e adoraram a religião, tornando-se incrédulos dos templos. Além de dar grande valor às tradições religiosas como a lavagem das mãos antes das refeições (Mc 7.3) e ao recolhimento do dízimo (Mt 23.23), os fariseus jejuavam regularmente (Mt 9.14) e enfatizavam a observância do sábado (Mt 12.1). Entretanto, eram avarentos (Lc 16.14) e em suas orações gostavam de se vangloriar de seus atributos morais (Lc 18.11,12). Em razão do seu legalismo Jesus os repreendeu de forma corajosa (cf. Mt 23), chamando-os de amantes dos primeiros lugares, hipócritas e condutores cegos, pois a religiosidade deles estava baseada no exterior, nos rituais e na justiça própria, em desprezo à parte mais importante da lei: o juízo, a misericórdia e a fé (v.23).

Todavia, Isaías 53 fornece-nos esperança em tempos de ateísmo crescente, religiosidade formal e incredulidade prática. O seu cumprimento profético de forma cabal em Cristo evidencia a veracidade das Escrituras e acima de tudo a fidelidade do próprio Deus. Encontramos esperança porque vemos, ainda hoje, a mão de Deus se manifestar em nosso meio. Ao contrário do deísmo, que acredita em uma divindade distante, que criou o universo e o abandonou à própria sorte, por meio de Cristo encontramos um Deus que intervém e se revela diariamente; é o Pai presente (Rm 8.15).

Inevitavelmente, o braço do Senhor tem se manifestado no nosso tempo. A palavra para braço, conforme Beacon, é ‘zeroa’ e indica o forte braço de Deus intervindo nas questões da humanidade, indicando a sua ação decisiva[ii].  Com efeito, a sua manifestação se dá mediante a sua provisão geral, para crentes e descrentes, mantendo a própria vida e suas condições, ou de modo especifico para aqueles o buscam e são alvos de sua graça salvadora.

Roger Scruton escreveu que Deus “tem uma relação íntima até com aqueles que o rejeitam. Assim como o esposo de um casamento sacramental, Deus é inevitável, ou evitável apenas por meio da criação de um vazio. Esse vazio se abre à nossa frente quando destruímos o rosto –  não apenas o rosto humano, mas o rosto do mundo também. O vazio sem Deus é aquilo com quem nos defrontamos quando nossos ambientes perdem o rosto”[iii]. Desse modo, ainda que os ateus possam não o reconhecer, negando-lhe a existência, o braço de Deus é quem os sustenta. Logo, ateístas são como crianças nos braços de um adulto, choramingando e dizendo que ele não existe. O que, de fato, é uma grande ironia.

Mas em Isaías 53 encontramos esperança porque sabemos que o braço do Senhor tem se manifestado de modo ainda mais específico na vida daqueles que o temem, por meio de sua graça. Para esses, Deus tanto é provedor quanto Salvador.

Nas Escrituras encontramos a promessa da provisão de Deus. Jesus disse: “Mas, buscai o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas” (Mt 6.33). Jesus está se referindo ao que ele havia acabado de mencionar: “Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. (v. 25). Longe de uma promessa de prosperidade e de triunfalismo, o Mestre está prometendo o básico da vida humana, baseando na provisão de Deus.

E tal provisão requer um coração dependente ao Senhor, confiando que ele é capaz de suprir as nossas necessidades. Foi esta a lição que Deus deu aos israelitas durante a peregrinação pelo deserto, ao dar-lhes o maná diário. O maná era a prova da provisão divina, mas tinha validade somente por um dia, à exceção da sexta-feira. Tal prazo de validade requeria, obviamente, dependência a Deus, na medida em que todos os dias os israelitas deveriam sair ao campo para recolher o alimento que caia dos céus.

Ainda que os israelitas estocassem o maná, imaginando que estariam providos e independentes por uma semana ou um mês, sem precisar sair ao campo, tal alimento apodreceria. Com isso, Deus estava ensinando ao seu povo a necessidade de confiar Nele e na sua provisão diária. Eis o motivo pelo qual Jesus orou: “o pão nosso de cada dia, dá-nos hoje…”.

Além da provisão, Deus manifesta-se por meio da sua obra salvadora. Aqui encontramos maior esperança ainda. O descortinar do texto em Isaías 53 vai evidenciar, como veremos, o Deus que provê salvação, por meio do Servo, como um cordeiro que foi levado ao matadouro, pondo-se por expiação do pecado. Maravilhosa esperança encontramos em um Deus que oferece seu filho para o perdão dos nossos pecados. Encontramos esperança porque tal salvação é por graça e não por mérito humano (Ef 2.8). Paulo escreveu: “Por que a graça de Deus se há manifestado, trazendo salvação a todos os homens” (Tt 2.11).

[Continua]

BIBLIOGRAFIA

[i] RICHARDS, Lawrence. Comentário Devocional da Bíblia. 1.ed. RJ: CPAD, 2012, p. 385.

[ii] PRICE, Ross E. e outros. Comentário Bíblico Beacon – Vol. 4 Isaías a Daniel. Rio de Janeiro: CPAD, p. 162.

[iii] SCRUTON, Roger. O rosto de Deus. São Paulo: É Realizações, 2015, p. 17-18.

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Levany Júnior

Levany Júnior é Advogado e diretor do Blog do Levany Júnior. Blog aborda notícias principalmente de todo estado do Rio Grande do Norte, grande Natal, Alto do Rodrigues, Pendências, Macau, Assú, Mossoró e todo interior do RN. E-mail: [email protected]

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