FOTOS IMAGENS-Mulher diz ao MP-SP ser vítima do médium João de Deus: ‘É um abuso disfarçado de cura’



Vítima de São Paulo relata ter sofrido abuso sexual de João de Deus — Foto: GloboNews/ReproduçãoVítima de São Paulo relata ter sofrido abuso sexual de João de Deus — Foto: GloboNews/Reprodução

Vítima de São Paulo relata ter sofrido abuso sexual de João de Deus — Foto: GloboNews/Reprodução

Uma mulher de 44 anos prestou depoimento na tarde desta terça-feira (11) ao Ministério Público de São Paulo para acusar o médium João de Deus de abuso sexual dentro da Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia (GO), em abril deste ano. “É um abuso disfarçado de cura, é um abuso covarde”, disse a mulher. Ao todo três mulheres foram ouvidas nesta terça no MP-SP. Outras duas também foram ouvidas na capital paulista. A defesa do médium João de Deus nega que ele tenha cometido abusos (leia ao final desta reportagem)

A mulher disse que frequentava a casa a cada três meses desde 2012 para ajudar as pessoas. Em 2017, ela descobriu um câncer e procurou o médium para fazer uma cura. Ela passou por uma cirurgia espiritual em grupo depois foi encontrar João de Deus pessoalmente. Foi quando disse ter sofrido o abuso em uma sala, com ela de costas para o médium. A mulher disse ainda ter medo de João de Deus. “Ele é o xerife da cidade.”

Os depoimentos das mulheres que acusam o médium João de Deus de abuso sexual estão sendo gravados em vídeo ou áudio pelo Ministério Público de São Paulo. “Seguindo a norma, estamos colhendo em áudio e vídeo os depoimentos para dar maior veracidade às denúncias”, afirmou Sorrentino ao G1.

G1, a TV Globo e o jornal “O Globo” têm publicado nos últimos dias relatos de dezenas de mulheres que se sentiram abusadas sexualmente pelo médium. Não se trata de questionar os métodos de cura de João de Deus ou a fé de milhares de pessoas que o procuram.

Mulheres fazem denúncias contra João de Deus no MP
Jornal GloboNews Edição das 16h

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Mulheres fazem denúncias contra João de Deus no MP

Mulheres fazem denúncias contra João de Deus no MP

Veja o depoimento:

Consulta

“Eu frequento Abadiânia, a Casa Dom Inácio de Loyola desde 2012. O primeiro dia que estive lá foi o mesmo dia da Oprah (Winfrey). Desde então tenho ido lá de três em três meses sem ter nenhuma doença grave. Ia por amor. Para ajudar as pessoas, para orar para as pessoas. Nunca tive um contato direto com o médium João, mas sempre que passava na fila por ele, ele se dirigia como se tivesse incorporado por uma entidade me pedindo que a entidade dizia que eu o procurasse a sós.

Nunca tive essa necessidade porque não tinha nenhuma doença e não sentia essa necessidade. Até que em 2017 eu adoeci, fiquei com câncer. Foi um ano muito difícil, passei por cirurgia, quimioterapia, radioterapia, hormonioterapia e quando chegou ao final do processo eu estava muito debilitada, muito fraca. Quis voltar à Casa Inácio de Loyola para pedir para o médium uma cura espiritual para eu me restabelecer.

Ele fez uma operação espiritual em grupo com outras pessoas e pediu para que eu voltasse em 30 dias. Eu voltei em 30 dias, dessa vez sozinha (na primeira vez estava com meu marido) e quando passei para a revisão da minha cirurgia, que é como eles falam, mais uma vez ele como se estivesse incorporado por uma entidade falou: ‘Você precisa falar com o médium João. Passe à tarde com ele’.

Dessa vez eu fui, porque eu tinha um motivo, queria saber se estava totalmente curada, queria restabelecer minha energia. Quando eu entrei em uma salinha lateral que existe na casa, onde já vi várias mulheres entrando. Ele veio acompanhado por um assistente da casa que está há muitos anos lá. Ele abriu a salinha, ela foi fechada. A salinha tem duas portas, uma que dá para a lateral da casa e a outra que dá para uma sala de passes, onde ficam muitas pessoas que tomam passes e fazem essas cirurgias espirituais em grupo.

As duas portas foram trancadas. Ele pediu para que eu sentasse e falasse o que estava acontecendo. Eu falei que a entidade pediu para eu procurar o senhor. Eu o chamava de pai e ele chamava de filha como ele chama todas as pessoas que frequentam a casa. Contei que estava muito debilitada do tratamento, procurando uma ajuda para me reerguer, que a quimio e a radio tinham judiado muito de mim. Estava enfraquecida, vulnerável.

O médium João de Deus é alvo de denúncias de abuso sexual contra mulheres  — Foto: Reprodução/EPTVO médium João de Deus é alvo de denúncias de abuso sexual contra mulheres  — Foto: Reprodução/EPTV

O médium João de Deus é alvo de denúncias de abuso sexual contra mulheres — Foto: Reprodução/EPTV

Ao contar para ele todo o meu processo me emocionei e chorei. Ele perguntou se eu tinha alguma espécie de tatuagem ou marca de nascença. Eu falei que tinha uma marca. Ele falou deixa eu ver essa marca, através dela pode me fornecer muita coisa da sua genética. Achei estranho porque a tatuagem não poderia fornecer. Estava com vestido longo, abaixo do joelho, mostrei uma marca que existia na minha coxa. Vi que ele começou a passar a mão na minha perna, e aí vem pensamentos conflitantes, até que ponto um médium pode passar a mão em você.

Fiquei um pouco incomodada, mas como eu via que ele fazia cirurgias espirituais, que cortava as pessoas e às vezes tocava no seio da pessoa e fazia cortes, imediatamente recolhi meu pensamento que ele pudesse estar me abusando e relaxei novamente.”

Abuso

“Aí ele me colocou em pé de costas. Falei: ‘Mas pai, eu estou curada?’. Ele falou “Você está quase curada, mas eu vou te curar”. Imediatamente ele me colocou de costas em uma pia, pediu para respirar intensamente. Ele falou: “Você não está se entregando, quero que respira mais”. Comecei a respirar. Ele falou para eu passar a mão no meu quadril, movimentos circulares. Eu passei. Em seguida ele já prensou meu corpo contra o dele de forma que o membro dele ficasse nas minhas nádegas. Eu congelei. Fiquei completamente sem saber o que pensar. Nisso ele começou a acariciar meu corpo, as minhas nádegas, meu tórax, meu seio e ele começou a perder o controle, respirando muito forte.

Me pressionava mais ainda eu chorava só pensando como eu ia sair daquela situação. Aí ele gritava: ‘Você não está sentindo essa energia?’. Eu falava: ‘Não estou sentindo nada e não estou entendendo o que está acontecendo aqui’.

Ele dizia: “Você tem que movimentar o quadril para trás e para a frente”. Eu fique completamente endurecida e não fiz o que ele pediu. Ele disse: “Você eu precisa dedilhar os dedos na minha virilha”.

Fiquei estagnada. Ele ficou nervoso e falou assim: ‘Estou indo para o fundo do poço por você, pelos seus filhos e pelo seu marido e você não está se entregando’.

Eu disse: “Não estou sendo ingrata, eu só quero saber o que está acontecendo aqui, estou me sentindo incomodada”.

Ele falou: “Você tem um excesso de energia sexual estou tratando da sua energia. É lógico que você não vai entender, você não sabe nada sobre isso.”

Mulher disse ter medo de denunciar João de Deus — Foto: GloboNews/ReproduçãoMulher disse ter medo de denunciar João de Deus — Foto: GloboNews/Reprodução

Mulher disse ter medo de denunciar João de Deus — Foto: GloboNews/Reprodução

Eu falei: “Não estou gostando”.

Ele falou: “Vai embora, pode ir. Vai para onde você quiser.”

Eu falei: “Eu tenho que voltar aqui? Eu estou curada? E a minha cura?”

Ele falou: “Volta quando você quiser, vai”

Eu em prantos, chorando muito. Tinha uma pessoa do outro lado da porta que me conduziu para eu sentar em uma poltrona. Eu tremia e chorava muito. Quando saí de lá saí devastada e sem saber o que pensar, pensando que eu estava em um pesadelo, que em uma hora eu iria acordar e ficar tudo bem.”

Volta para casa

“Fui embora, contei para o meu marido por whatsapp. Fiquei com muito medo porque ele é um chefe da cidade, ele manda em Abandiana. Todos os taxistas obedecem a ele, os hotéis ele abre e fecha a hora que ele quer.

Estava apavorada contando para o meu marido por whatsapp o que tinha acontecido. Nesse dia caiu uma tempestade em Goiânia, pousei tarde em Guarulhos, cheguei de madrugada em casa e pude contar ao meu marido o que aconteceu.

Foram três dias de muito choro, muita conversa. Aos poucos consegui relatar para ele alguns trechos. Depois disso a gente ficou discutindo o que fazer, porque o que eu ia falar? As pessoas me perguntam, você não reagiu, não gritou?

Como eu ia gritar naquela sala com um homem que tem muita força, me pressionando, com duas portas trancadas. E a porta que se abriu tinha milhares de seguidores que acreditam nele. Se eu falasse que fui abusada provavelmente seria apedrejada de lá.

Quando cheguei em São Paulo pensei em procurar a Delegacia da Mulher, mas não tinha nenhuma prova de corpo delito. Não tinha segurança se era o certo. Tinha medo de expor meu nome e minha família. Fiquei com muito medo. Investigamos por redes sociais tudo sobre ele e descobri que ele já tinha muitas acusações. Seu João Teixeira de Faria, chamado de João de Deus, já foi acusado de assassinato, de abuso sexual, de exercício ilegal da medicina, sedução de menores.”

‘Abuso disfarçado de cura’

“Conversando com amigos nós encontramos um blog lá fora que tem denúncias gravíssimas sobre ele de abuso sexual. São milhares de mulheres. Sempre os abusos são da mesma forma. Ele coloca as mulheres de costas, fala que vai curar e abusa. Então é um abuso disfarçado de cura.

É um abuso covarde. Esse senhor é um doente. Ele abusa de crianças, adolescentes, mulheres em estado de fragilidade máxima. Eu me encontrava em estado de fragilidade absoluta. Depois disso resolvi esperar um pouco para ver se encontrava outras vítimas. Encontrei uma pessoa que me indicou uma repórter e aí eu conversei com essa repórter e consegui denunciá-lo para a mídia.

Agora nós temos muitas vítimas que estão aparecendo. Muitas mulheres com denúncias mais graves do que a minha. Abuso de crianças e pessoas que até já faleceram e o filho está representando a mãe. É muito triste porque ele tem ou tinha um dom tão divino e se aproveitou desse dom para abusar de tantas mulheres de uma forma muito covarde.

Eu sinto muito por ele, porque acho que o preço vai ser alto. E tomar a decisão de denunciar para encorajar todas as mulheres que passaram por abuso.”

Mulher diz ter sido abusada por João de Deus — Foto: GloboNews/ReproduçãoMulher diz ter sido abusada por João de Deus — Foto: GloboNews/Reprodução

Mulher diz ter sido abusada por João de Deus — Foto: GloboNews/Reprodução

Denúncia

“Quero dizer para elas que eu me sinto aliviada após ter denunciado. Tenho certeza que se vocês tirarem quilos e quilos de peso das costas a garganta vai desbloquear, o coração vai ficar mais leve. Todas nós temos o dever de denunciar este monstro, este homem doente que abusa de milhares de pessoas. Ele tem 40 anos de profissão, 40 anos e abuso ou mais, se não fazia isso antes.

Se ele receber três, quatro, cinco mulheres na salinha por dia, imagina a quantidade de mulheres que foram abusadas. Não tenham medo de denunciar. Todas juntas somos muito mais fortes. Confio na Justiça e no Ministério Público. Ele vai ser julgado e culpado. Dessa vez ele não tem escapatória. Denunciam e sejam felizes.

Gostaria muito que isso chegasse lá fora. Na Oprah, principalmente, que divulgou tanto ele. Se ela pudesse me escutar, peço de coração, Oprah, que você divulgue o monstro que é esse João de Deus, que de Deus ele não tem nada. “

João de Deus nega acusações

O advogado Alberto Toron, que defende o médium, afirmou que o cliente nega as acusações e que ele está à disposição da Justiça para esclarecimentos.

“Muito enfaticamente ele nega. Ele recebe com indignação a existência dessas declarações, mas o que eu quero esclarecer, que me parece importante, é que ele tem um trabalho de mais de 40 anos naquela comunidade, atendendo a todos os brasileiros, gente de fora do país, sem nunca receber esse tipo de acusação”, disse.

Além disso, o advogado esclareceu que o padrão de João de Deus era atender a todos em grupo. “Eventualmente atendeu alguma pessoa, alguma autoridade sozinho, isso é um episódio localizado. Mas pessoas, mulheres, crianças em geral, eram atendidas coletivamente diante de um grande número de pessoas”, continuou.

Por fim, disse que o cliente vai colaborar com as investigações. “Amanhã mesmo [segunda-feira, 10] nós vamos nos dirigir às autoridades judiciárias da cidade de Abadiânia para dizer que ele está à disposição da polícia, do juiz, do Ministério Público para ser ouvido em qualquer momento”, disse.

“Achamos que tudo isso deve ser objeto de uma investigação marcada pela seriedade e nós esperamos que isso aconteça para que a verdade venha à tona”, concluiu Toron.

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