BRASIL BR-AGORA VAI!? Espanha testa programa inspirado no sistema de passos do Alcoólicos Anônimos para reabilitar corruptos


AGORA VAI!? Espanha testa programa inspirado no sistema de passos do Alcoólicos Anônimos para reabilitar corruptos

Urdangarin: casado com uma irmã do rei Felipe, ele está na rehab para presos por corrupção – Ballesteros/EFE

Muito já se estudou sobre os meandros da mente criminosa de assassinos, estupradores e ladrões contumazes. Em Sevilha, na Espanha, o psiquiatra Sergio Ruiz, diretor do Hospital Psiquiátrico Penitenciário local, resolveu enveredar por uma outra trilha, esta pouco explorada: os traços de personalidade, as motivações e os valores morais dos corruptos. Ao fim de sua pesquisa, Ruiz elaborou um programa vagamente inspirado no elogiado sistema de passos dos Alcoólicos Anônimos e produziu, assim, a primeira rehab voltada para criminosos de colarinho-branco. Encampado pelo Ministério do Interior e pela Secretaria de Instituições Penitenciárias, o programa vem sendo aplicado desde março a mais de 100 detentos — sendo o mais conhecido deles Iñaki Urdangarin, cunhado do rei Felipe VI — a título experimental, na expectativa de que, se o esforço for bem-sucedido, os reabilitados possam ser reintegrados à sociedade sem risco de ceder a novas tentações.

Apelidado de Pideco (Programa de Intervenção em Crimes Econômicos, em português), o projeto tem duração prevista de dez a onze meses, durante os quais os participantes são submetidos a sessões semanais de terapia em grupo: sentados em círculo, cada um é convidado a compartilhar sentimentos e analisar o próprio comportamento. Nos encontros, os psicólogos, treinados para “se conectar” com os presos, os encorajam a assumir a culpa por seus delitos e refletir sobre ética e integridade. Segundo o psiquiatra Ruiz, três fatores distinguem os criminosos de colarinho-branco: narcisismo, egocentrismo e enorme capacidade de justificar, ou atribuir a outros, os seus deslizes.

À medida que o tratamento avança, os infratores são convidados a prestar serviços comunitários e ajudar pessoas desfavorecidas, como forma de desenvolver empatia. Outra ação estimulada é o pedido de perdão a quem prejudicaram. “Os crimes econômicos fazem muitas vítimas indiretas. Conversar com alguém que tenha sido afetado por sua ação ajuda o detento a se colocar no lugar dele”, explica Ruiz. O programa de rehab não proporciona redução de pena, mas influi na avaliação de pedidos de liberdade condicional e outras regalias. O obje­ti­vo principal é evitar casos de reincidência. “Idealmente, e se a sentença permitir, eles podem até voltar a exercer as antigas funções”, acredita o psiquiatra.

Entre os presos que participam da primeira edição do programa, os mais conhecidos são o ex-vice-­primeiro-ministro Rodrigo Rato, condenado por desvio de dinheiro, e o ex-atleta olímpico e ex-duque Urdangarin. Casado com a infanta Cristina, filha do meio do rei Juan Carlos (que abdicou em favor do filho Felipe e também está caído em desgraça), Urdangarin aproveitou sua posição na família real para criar uma rede de negócios ilegais disfarçados em uma fundação. Sentenciado a mais de cinco anos de prisão em 2018, desde o fim do ano passado ele pode sair durante o dia para fazer trabalho voluntário e visitar a família um fim de semana por mês. A meta dos organizadores do programa é ampliá-lo para o maior número de presídios possível e, dessa forma, conseguir reduzir os escândalos de fraude e suborno frequentes no país. A Espanha ocupa a 32ª posição no ranking de percepção da corrupção da Transparência Internacional, bem melhor do que o Brasil (94ª), mas pior do que a Alemanha e a França. “Além de ser democracia recente, com instituições ainda se solidificando, tem uma cultura em que relações pessoais e familiares se misturam facilmente com negócios e política”, diz Manuel Villoria, professor da Universidade Rey Juan Carlos de Madri. Soa familiar?

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