Assú RN ;Lava Jato vê desvios do petrolão como corrupção, não como caixa 2 eleitoral


Josias de Souza

Ainda que fosse bem sucedida, a tentativa da oligarquia partidária da Câmara de anistiar o caixa dois teria pouco ou nenhum efeito no caso do petrolão. Para a força-tarefa da Lava Jato, o escândalo atual é comparável, nesse particular, ao do mensalão. Também naquele caso, parte dos acusados alegou que o dinheiro sujo era mero caixa dois. Mas o Supremo Tribunal Federal condenou-os por crimes como corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e até peculato.

A Lava Jato detectou uma sofisticação dos criminosos: um pedaço da verba roubada da Petrobras e de outros guichês do Estado foi convertido em doações de aparência legal. Mas o Ministério Público Federal e o juiz Sérgio Moro logo farejaram a esperteza. Em ofícios remetidos ao Tribunal Superior Eleitoral, Moro alertou para a anomalia. Num deles, de fevereiro, o juiz enviou provas requisitadas pela Justiça Eleitoral. E anotou que ficou ”comprovado o direcionamento de propinas acertadas no esquema criminoso da Petrobras para doações eleitorais registradas.” Em português claro: os criminosos transformaram a Justiça Eleitoral em lavanderia de verbas malcheirosas.

No mês passado, ao mandar soltar o marqueteiro João Santana e sua mulher Mônica Moura, Sérgio Moro usou termos duros para criticar a naturalidade com que o casal do marketing das campanhas petistas alegou que o dinheiro entesourado numa conta secreta na Suíça viera do caixa dois do comitê Dilma-2010. “É trapaça que não pode ser subestimada”, anotou o juiz, antes de ”censurar em ambos —marido e mulher— a naturalidade e a desfaçatez com as quais receberam, como eles mesmo admitem, recursos não contabilizados. […] O álibi ‘todos assim fazem’ não é provavelmente verdadeiro e ainda que o fosse não elimina a responsabilidade individual.” Moro acrescentou: ”Se um ladrão de bancos afirma ao juiz como álibi que outros também roubam bancos, isso não faz qualquer diferença em relação a sua culpa.”

As palavras do juiz da Lava Jato são comparáveis a expressões usadas pela ministra Cármen Lúcia, hoje presidente do Supremo Tribunal Federal, no julgamento que condenou o ex-tesoureiro petista Delúblio Soares no mensalão: “Acho estranho e muito grave que alguém diga, com toda tranquilidade, que ‘ora, houve caixa dois’ na tribuna do tribunal supremo do país como se fosse algo banal, tranquilo, que se afirma com singeleza. Caixa dois é crime; caixa dois é uma agressão à sociedade brasileira; caixa dois compromete, mesmo que tivesse sido isso, ou só isso; e isso não é só; e isso não é pouco!”

Deve-se a tentativa de empurrar a Lava Jato para o caldeirão do caixa dois a uma deficiência da legislação. Não há nenhuma dúvida de que a caixa paralela constitui um delito eleitoral. É um tipo de abuso do poder econômico que sujeita o autor a penas como a perda do mandato e à inelegilidade. Mas há, sim, uma controvérsia quanto à possibilidade de enquadrar o caixa dois como um delito criminal.

Um ministro do TSE explicou ao blog que há nos arquivos do tribunal decisões que se guiaram por duas correntes divergentes. Numa, o caixa dois é considerado um delito atípico do ponto de vista criminal. Quer dizer: não haveria uma lei tipificando o crime. O que impediria a imposição de sanções criminais aos adeptos da prática.

Noutra corrente, os julgadores criminalizam o caixa dois escorando-se no artigo 350 do Código Eleitoral. Esse artigo anota que é crime “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. Assim, a omissão de valores na prestação de contas dos candidatos à Justiça Eleitoral seria passível de punição também na esfera criminal, não apenas na eleitoral. Hoje, a pena máxima prevista é de 5 anos de cadeia, mais multa.

Foi em função dessa controvérsia que os procuradores da Lava Jato incluíram no item 8 do pacote de dez medidas anticorrupção a ideia de aprovar uma lei que deixe mais clara, acima de qualquer dúvida, a criminalização do caixa dois. Os barões da Câmara aproveitam para esgrimir a tese segundo a qual a aprovação da lei requerida pela Procuradoria passaria uma borracha sobre todo o caixa dois praticado antes da aprovação do projeto, já que nenhuma lei pode ser aplicada retroativamente.

Escondem-se atrás da articulação da anistia para o caixa dois líderes de pelo menos seis partidos: PSDB, DEM, PMDB, PT, PP e PR. A exemplo de João Santana, todos afirmam que a prática é generalizada. Ao justificar o próprio caixa dois invocando a existência de outras caixas, visam não a moralização, mas a perpetuação da imoralidade.

Os partidos de oposição juntaram-se à caravana porque vem aí a delação premiada dos ex-executivos da Odebrecht. Estima-se que, se forem homologados, os depoimentos pendurarão de ponta-cabeça nas manchetes os nomes de mais de uma centena de políticos beneficiários de repasses da empreiteira que ajudou a assaltar a Petrobras. Entre eles luminares tucanos.

O tucanato avalia que a anistia do caixa dois lhe convém porque seus líderes irão sustentar que, nos seus casos, os repasses não podem ser classificados como propina ou corrupção. Por quê? Como fazia oposição aos governos de Lula e Dilma, o PSDB não dispunha de poder para proporcionar negócios aos doadores. Assim, o crime seria ”apenas” o caixa dois, não corrupção e lavagem de dinheiro. Resta saber se vai colar.

Blog do BG: http://blogdobg.com.br/#ixzz4KywqucC9realcedulasfolha1

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Levany Júnior

Levany Júnior é Advogado e diretor do Blog do Levany Júnior. Blog aborda notícias principalmente de todo estado do Rio Grande do Norte, grande Natal, Alto do Rodrigues, Pendências, Macau, Assú, Mossoró e todo interior do RN. E-mail: [email protected]

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